95 g/km de CO2: Diferentes despertares numa Europa a 27
Levando em linha de conta a nova realidade eléctrica que colocou em alerta máximo praticamente todo o sector automóvel europeu – tema iniciado no anterior texto deste mini-dossier “95 g/km de CO2” – voltemo-nos agora para os construtores, grupo que se viu obrigado a acordar para a vida e para a imediata necessidade de investimento e/ou desenvolvimento do outrora visto como quase futurista Veículo Eléctrico (VE), para a inerente causa da sustentabilidade e para as demais questões climáticas.
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Se uns já nasceram ligados à tomada, como é o caso da norte-americana Tesla, outros há que se foram munindo de propostas e até já têm bastantes modelos híbridos plug-in (PHEV) ou VE – e mesmo fuel-cell/hidrogénio – nos seus catálogos, caso da dupla japonesa Toyota/Lexus, grupo que conta com uma bastante abrangente gama verde, que lhe permite ser, por esta altura, a que menor diferencial tem para com os novos e muy rígidos objectivos definidos pela UE.
Já em termos de vendas imediatas VE, os holofotes assentaram, até à data, nas criações de outra dupla, a Renault/Nissan, marcas que vendem que nem pãezinhos quentes, encimando, na maioria dos casos, as tabelas dos diferentes mercados deste segmento 100% eléctrico.
Há ainda quem já tenha anunciado que, no curto prazo, irá contar com pelo menos um modelo VE/PHEV em todas as suas marcas, como o Groupe PSA, aplicando a mesma receita nas gamas Peugeot, Citroën, Opel e DS Automobiles, marca premium que até desenvolveu uma assinatura própria E-TENSE. Algo semelhante fez a Mercedes-Benz, com a sigla “EQ” para modelos PHEV e full-EV, para fazer frente aos vizinhos “i” da BMW, grupo que, por sua vez, tem a Mini que também está aderir à moda electrificada. O também alemão Grupo Volkswagen, hoje associado à Ford a uma escala mundial no domínio dos EV, criou toda uma nova gama de modelos 100% eléctricos, sob uma mesma assinatura “ID”.
Já outros irão fazer transitar a totalidade da sua oferta para uma realidade 100% verde, como é já a aposta da smart, a que se seguirá a Volvo Cars, seguindo os passos da Polestar, marca autónoma que os suecos criaram para esta vertente, ou mesmo os japoneses da Honda, que se mantêm orgulhosamente independentes, entre outras.
Mas outros ainda acreditam – e defendem até, com provas válidas – a possibilidade de se poderem manter os Motores de Combustão Interna (MCI) no mercado, com emissões marginais, fruto das tecnologias inovadoras neles empregues, sendo aqui exemplos o revolucionário bloco 2.0 Skyactiv-X da Mazda e o igualmente tecnológico motor 1.5 TSI ACT BlueMotion da Volkswagen, entre outras soluções de maior teor ambiental. Já a Hyundai apostou na diversificação dentro de um mesmo modelo, dotando o IONIQ de diferentes alternativas mecânicas Electric, Hybrid e Plug-in Hybrid, passos que a igualmente sua Kia irá, naturalmente, seguir-lhe.
Sem nos querermos tornar demasiado extensivos nos exemplos existentes em cada marca ou construtor, alertamos apenas que ainda há muitos outros que se mantêm sob o efeito do veneno profundo do petróleo, socorrendo-se de soluções mais ou menos adequadas para minimizar os estragos dos MCI que equipam os seus modelos, sigla que a UE quer cada vez menos ouvir falar, fruto desse seu objectivo declarado 100% verde. São os casos dos construtores de modelos de cariz mais desportivo ou exclusivista, que irão tentar aproveitar, até à última, os descontos nas multas das emissões, pelo facto de estarem inseridas nos grupos que actualmente os detêm. Veremos até quando se conseguem vender na Europa!
Tesla e Nissan LEAF em destaque num mercado nacional ainda residual
Como parêntesis final, refira-se que dos 7.096 VE vendidos em Portugal no ano passado, 1.639 foram Nissan LEAF – por cá é o VE mais vendido pela 9ª vez em 10 anos – batendo o Tesla Model 3 (1.543). Por marcas, a Tesla encabeçou a lista, com 1.979 matrículas, seguida da Nissan (1.759) e da Renault (1.107), trio que representa, no seu conjunto, cerca de dois terços do mercado nacional destas soluções 100% ligadas à corrente.
Acrescente-se que, de acordo com as estatísticas da ACAP, as vendas de VE pesam uns ainda residuais 2,7% no bolo de um mercado nacional 90,6% assente nas variantes puras de motores de combustão interna (MCI), a gasolina ou diesel. A restante fatia divide-se entre propostas híbridas, eléctricas ou não, e a combustíveis alternativos, como o Gás Natural Comprimido.
O Honda CR-V Hybrid já passou pela Garagem. Fica a conhecê-lo aqui.
Isto na vertente de ligeiros (passageiros e comerciais), pois o sector dos pesados, onde também já existem propostas VE, perfilando-se outras tantas para um próximo futuro, só se venderam 17 unidades, um mero fiozinho de 0,3% entre o volume de 5.757 viaturas matriculadas em 2019, 94,6% delas, naturalmente, Diesel. As restantes , dividiram-se entre camiões híbridos (0,3%) e a Gás Natural Comprimido ou Liquefeito (4,7%), aqueles que são os combustíveis mais alternativos ao gasóleo neste mercado em particular!
Entre os nossos vizinhos da UE, depois de um domínio norueguês de 8 anos, em 2019 a Alemanha (63.281 VE) e a Holanda (61.861 VE) ultrapassaram os nórdicos (60.316 VE) nas vendas destes automóveis 100% a baterias. Isto em volume, pois já em quota de mercado, os VE representam 42,4% (praticamente metade) das vendas totais de automóveis na Noruega, fatias que na Alemanha e Holanda se traduzem em 1,8% e 13,9%, respectivamente. Ou seja, comparativamente à Alemanha e mantidas as devidas distâncias, os nossos 2,7% até nem destoam e a tendência de subida parece ser mesmo para continuar, pois os quase 7.100 VE vendidos por cá em 2019 bateram o máximo de 4.326 alcançado em 2018 e estão muito à frente dos 1.859 matriculados um ano antes.
Independentemente do sector, o El Dorado europeu passou, definitivamente, a ser a electricidade e, como tal, venham de lá muitos VE e até alguns PHEV mais verdes e matem-se – gradualmente e depois de vez, do seio de uma UE (para já a 27 países) – os veículos com motores 100% térmicos, mesmo se dotados de soluções mild hybrid ou outras que tais.
Já o restante planeta divide-se por aqueles a que me referi no primeiro capítulo deste mini-dossier, os países que têm interesses declarados na continuidade dos combustíveis fósseis, mesmo com maior ou menor contestação interna, ao mesmo tempo que deixam para amanhã a temática da sustentabilidade. A ler, em breve.
Fotos: oficiais