Um Ford veloz e Raptor. Se não gostas que te apontem o dedo, não leias isto
Este ensaio começou com um problema. É um problema bom, admito, mas não deixa de o ser. Onde estacionar um veículo com 5,4 metros de comprimento na zona onde vivo, sem ficar com a sensação de que a caminhada até casa não é praticamente igual àquela que faço quando venho da estação de comboio a pé? É que a Ranger Raptor não é grande. É gigante! Ainda assim, a versão europeia tem menos meio metro do que a versão do Tio Sam, com base na F-150. Mas eu não me estou a queixar, Ford! Se um dia, por acaso, tiverem uma Raptor de 5,9 metros cá em Portugal, eu também quero enfrentar esse ainda maior problema de estacionamento.
Entrar é subir. Para isto, a pega no pilar A é indispensável, assim como os estribos, que nos ajudam a sentar no primeiro andar para nos instalarmos a bordo desta super especial Ford Ranger. Lá em cima, confortavelmente sentado, rapidamente me apercebo que dos outros carros só vejo o tejadilho. Primeiro destino: parque subterrâneo de um hipermercado. Aqui, surgem os primeiros olhares e os desavergonhados indicadores que não largaram a Raptor enquanto o campo de visão assim o permitiu. Eu sei que só a grelha negra com o enorme FORD, assusta. Mas eu só queria ir comprar umas coisas, passando despercebido como normalmente passo. Pirei-me dali e assim que vi um lugar, apontei a Raptor com a precisão possível. Um bocadinho à frente, um pouco para trás, e lá a consegui estacionar e seguir o meu caminho até ao corredor dos iogurtes.
Compras feitas, e com a experiência fora de estrada planeada para a manhã seguinte, lancei-me numa etapa nocturna de condução. Com pouco trânsito nas estradas, pude explorar um pouco melhor o motor biturbo dois litros Diesel da Ranger Raptor preparada pela Ford Performance. São duas toneladas e meia de peso, mas os 213 cavalos e uns não menos impressionantes 500 Nm mostraram estar mais do que à altura, respondendo sempre com vigor. A caixa de 10 velocidades tem também uma grande influência na facilidade com que a Raptor acelera. E não lhe faltam patilhas no volante, caso queiramos ter outro domínio sobre os acontecimentos. Durante estes quilómetros ninguém me apontou o dedo. Eu não me apercebi. Ia depressa e a escuridão protegeu-me desses olhares indiscretos.
Mais do que o andamento, impressiona o conforto. E não falo do equipamento, que é muito, ou do espaço, que é enorme, Falo da forma como a Raptor rola e como absorve tudo o que se lhe atravesse no caminho sem sacudir, sem saltitar. Lombas? Como assim? Buracos? Onde? Acredita, é imparável. E muito por culpa dos amortecedores da Fox e da enorme quantidade borracha que calça as jantes de 17 polegadas, uma combinação que revela o que de melhor a Raptor tem para dar quando a apontamos à floresta, aos caminhos, valas e obstáculos que pensamos serem um desafio para um convencional veículo todo-o-terreno. Só que este não é um convencional veículo todo-o-terreno.
Lembro-me do que disse ao Pedro Francisco (o autor dos belos quadros que acompanham este nosso trabalho) nessa manhã quando encontrámos uma vala com potencial para testar as capacidades da Raptor: “Passa sem problema, mas é capaz de roçar um pouco por baixo.” Nem por sombras. Limitei-me a activar a tracção às quatro rodas. A Raptor nem pestanejou e o Pedro pediu-me para repetir porque as fotografias estavam a ficar óptimas. Que chatice, não me apetecia repetir! Nem ali, no meio do nada, enquanto esperavamos que o Sol nascesse, a Raptor passou despercebida aos pescadores que já por ali andavam à procura do melhor sítio para ganhar o dia. Um até nos abordou e fez algumas perguntas que inevitavelmente levaram ao preço. Sim, mais de 60 mil euros.
Muito mais do que um automóvel de trabalho, ideal para uma quinta, por exemplo, a Ford Ranger Raptor é um veículo de lazer (ideal para uma quinta, por exemplo, sem limites de velocidade e sem peões. Acorda, João. Acorda!). E se a tua ideia de lazer é todo-o-terreno, então tens aqui uma viatura mais do que bem apetrechada para responder a tudo o que lhe possas atirar. Já falámos da suspensão e dos pneus BF Goodrich, mas para além disso consegue bloquear o diferencial traseiro e existem também redutoras para trepar umas paredes. Ao toque de um botão, a Raptor oferece igualmente seis modos de condução. Para além do Normal e do habitual Sport, conta com outros indicados para circular sobre pedras, areia, neve, lama…por aí fora. No entanto, elejo o Baja como o meu preferido. Venham de lá essas atravessadelas!
Apontaram-me o dedo quando fui às compras e quando passei em frente a escolas e esplanadas. Os olhares continham um misto de “que cena mais espectacular!” com “para que raio serve um carro deste tamanho?”. Aos que reprovaram a minha passagem, fiquem sabendo que nunca quis ocupar dois lugares no estacionamento, nem tão pouco assustar as vossas crianças no final de um dia de aulas. Não quis igualmente bloquear-vos a vista enquanto desfrutavam do vosso café nesse belo final de tarde. Eu sei que só me apontaram o indicador e eu, com esse dedo, não me ofendo.
Porém, antes de devolver a veloz e Raptor azul, fui lavá-la às instalações de um outro animal também ele grande e da mesma cor. Fui devolver à Terra a terra que trouxe comigo nos pneus, guarda-lamas e estribos. Enquanto a alta pressão da água retirava 20 kg de lastro à pick-up da Ford, um grupo de malta do motocross apontava-me os dedos. Eram polegares virados para cima acompanhados de sorrisos de aprovação. É espectacular, não é? Para que serve? Serve para isto!
Fotos: Pedro Francisco