O dia em que conduzi um Audi R8 em Ascari
Quando o convite da Audi caiu na caixa de email da redacção da saudosa Auto MAG, tive de conter o meu entusiasmo não fosse aquele trabalho ser atribuído a um dos meus colegas. Felizmente, o email foi reencaminhado para a minha caixa de email e alguns dias depois dei por mim num avião em direcção ao aeroporto de Málaga. Ali, aguardava-me a mais recente geração do Audi A1, modelo que a marca apresentou igualmente nesse evento.
Já a bordo de um A1 40 TFSI, defini como destino a belíssima cidade de Ronda. Não era esse o primeiro destino, embora o tenha visitado, adorado o que vi e querer agora lá voltar com mais tempo. Mas não, o meu destino ficava um pouco antes de Ronda, a primeira cidade a dar o nome a um modelo da SEAT, em 1982. O meu destino era o Ascari Race Resort, um autêntico paraíso para quem gosta de automóveis e de competição. E as estradas que até lá rasgam a paisagem foram um autêntico convite a explorar o chassis e os 200 cavalos do mais pequeno dos Audi. No entanto, o melhor ainda estava para vir.
Logo no acesso ao complexo não me consegui conter ao ver um pouco do traçado de Ascari do meu lado direito. Estacionei, fiz o check-in e logo de seguida fiquei a saber que não só ia conduzir o novo Audi R8 em pista, como teria oportunidade de ser conduzido num R8 GT3 LMS com pilotos profissionais ao volante. Para melhorar um dia que estava já a ser soberbo, a dose de condução e de passeio a alta velocidade teria repetição após o pôr-do-sol.
Fiz a melhor figura possível ao vestir o fato de competição da Audi Sport e posso dizer que até não correu assim tão mal. Já o capacete que escolhi não tinha, nem de perto, nem de longe, o tamanho ideal para mim. Coloquei a balaclava e o capacete (até onde consegui) e lancei-me a Ascari a bordo do R8. O circuito montado para aquele dia era uma versão reduzida do traçado completo, mas ainda assim incluía zonas rápidas como os S Senna e a recta depois da curva Brundle – zona onde o corte foi feito – que se fazia a mais de 200 km/h, surgindo de seguida a icónica chicane do circuito.
Como de piloto só tinha o fato, o que posso partilhar convosco é que o R8 foi duplamente impressionante para um mero aficionado como eu, que abordou a experiência com precaução mas que quis, igualmente, aproveitar tão rara oportunidade de conduzir um supercarro naquele verdadeiro paraíso de alcatrão e correctores que contrastam com os belíssimos tons quentes da paisagem da Andaluzia. Impressionou pela performance mas, ao mesmo tempo, pela facilidade com que se deixa conduzir a ritmos elevados.
Sim, concordo que mais de 600 cavalos de potência é um número que mete respeito. Mais ainda quando o carro que conduzo diariamente tem 90. No entanto, a entrega de potência do motor é de tal forma imediata e linear que não chega a assustar. Pelo menos ali, num ambeinte controlado e seguro e sempre consciente de que estava a entrar em território desconhecido para mim. Assim, tentei, o melhor que pude, cumprir com as trajectórias aconselhadas e pontos de travagem indicados no briefing e, acima de tudo, desfrutar de um dia que não sei quando se repetirá.
Tudo mudou de dimensão quando me atirei para dentro do monstro de corridas que é o GT3 LMS com Frank Stippler ao volante. Bem preso na baquet e de câmara de vídeo na mão, “lancei-lhe um fixe” para lhe indicar que estava prontíssimo. Mas não estava. E isso ficou claro logo nas primeiras curvas. O som ensurdecedor do V10 e da transmissão sequencial passou imediatamente para segundo plano quando me apercebi da diferença de velocidade com que as curvas são feitas. O motor do R8 de competição é menos potente, mas isso também pouco importa face à também grande diferença de peso. A carga aerodinâmica e a aderência lateral dos pneus slicks é que me deixaram de queixo caído.
Jantei, à grande e à espanhola, e de seguida preparei-me para enfrentar o circuito em total escuridão. A brutal iluminação do R8 foi uma grande ajuda mas claramente os meus níveis de confiança estavam bem mais baixos. Apanhei até um pequeno susto ao abordar uma curva demasiado rápido, quando àquela hora do dia a muita borracha das rodas do R8 já tinha trocado o corpo do pneu pelo aderente asfalto do circuito. À noite o piloto de serviço no GT3 seria Marco Werner e pensei que, dadas as condições, não iria elevar a fasquia da experiência que tive durante a tarde. Mais uma vez, enganei-me.
Estes pilotos foram uma perfeita extensão orgânica da excelência mecânica que é o Audi R8 GT3 LMS e Werner deixou isso bem claro, apesar da escuridão, com inputs rápidos mas lineares no volante, perfeitamente coordenados com os pontos de travagem e de aceleração, os primeiros, bem além daqueles indicados para os amadores como eu. Depois de terminado o meu passeio, fui até ao muro das boxes assitir às voltas de outro jornalista que, tal como eu momentos antes, estava certamente a ter um dia para mais tarde recordar. Esta é a última memória que tenho daquele dia, a fluída e sensual dança de luzes do R8 ao desaparecer por entre as curvas escuras do circuito, ao som de um trovejante V10 mas sob um mágico e estrelado céu de Ascari.