O Citroën SM e os ralis: Primeiro tiro, primeiro melro!
Uma das muitas curiosidades envolvendo unidades do Citroën SM aconteceu no mundo dos ralis, com a vitória à geral alcançada na sua primeira saída em competição de sempre. Foi em 1971, na 17ª edição do demolidor Rali de Marrocos, 5ª prova pontuável para o então denominado Campeonato Internacional de Construtores, estrutura que haveria de dar origem, dois anos mais tarde, ao Campeonato do Mundo de Ralis, hoje WRC.
Num rali composto por onze longas especiais, que no seu conjunto somaram 1.200 km contra o cronómetro, o Citroën SM Maserati nº 16 viria impor-se aos muitos Peugeot 504 TI e Citroën DS 21 que, na altura, eram reis e senhores dos ralis de estrada – melhor dizendo de pedra solta e areia – que se corriam a norte de África. O feito ficou nos anais da história dos ralis no nome do francês Jean Deschaseaux – conhecido como “Raposa do Deserto” – e do seu navegador Jean Plassard. Para se ter uma ideia da dureza desta prova, dos 59 inscritos, 50 não a terminaram, com a particularidade da grande maioria ter desistido logo na especial de abertura!
No canto oposto também ali se registou a primeira desistência de sempre de um SM em competição, já que os seus companheiros Jean Vinatier e Pierre Thimonier viram a transmissão da sua pesada unidade – este SM de Grupo 1 pesava tonelada e meia – ceder naquela mesma Especial. Quem também não chegou ao final foi o Alpine-Renault A110 1600S de um tal de Jean Pierre-Nicolas, piloto que durante longos anos representaria a rival marca francesa. Navegado por Jean de Alexandris, ficariam pelo caminho com problemas de suspensão no Sector nº 4, questão que não afectava os SM e os DS, fruto da sua inovadora e híper-resistente suspensão bamboleante.
Se quiser assistir a um rali diferente dos actuais, assista aqui a essa edição memorável:
Do SM de Grupo 1 ao SM Proto de Grupo 5
A aventura do SM nos ralis teve continuidade nos anos seguintes, com a Citroën – através da teimosia do casal René e Marlène Cotton – a apostar numa evolução do modelo, o SM Proto Maserati, encolhendo-lhe a traseira e a distância entre-eixos (em 60 cm), mais outras evoluções de conteúdo, tornando o pesado conjunto cerca de 300 kg mais leve.
Em 1972, altura em que os campeonatos internacionais de ralis permitiam a participação de protótipos (Grupo 5), a equipa francesa até recorreu a nomes já grandes no mundo dos ralis, como os suecos Björn Waldegaard / Hans Thorzelius, que participaram no Rali de Portugal desse ano, terminando a prova no 3º lugar da geral. Veja o estranho SM nº 72 nestas imagens históricas da prova portuguesa:
Enquanto isso, o finlandês Rauno Aaltonen, navegado pelo britânico Henry Liddon, ia a Marrocos tentar repetir o feito da marca no ano anterior, mas desistiria com problemas de transmissão. Em 1973 fez-se nova tentativa no Rallye Bandama, na Costa do Marfim, através dos franceses Bob Neyret / Jacques Terramorsi, e Guy Verrier / Georges Umbricht, mas a nova evolução “Bandama” do SM terminou fora do pódio, no 5º e 6º lugares, respectivamente. Ainda assim, não foi, de todo, um mau resultado, pois fruto da sua robustez, foram duas das apenas oito equipas a terminar, das 59 que haviam partido para a demolidora prova de resistência africana, numa edição com quase 3.600 km de percurso!
Só que o destino do SM Proto viria a ficar traçado quando a FIA uniformizou as regras para os ralis, nomeadamente face à estreia, em 1973, do Campeonato do Mundo de Ralis – Construtores, banindo os protótipos e o inerente Grupo 5.
Depois disso, o grande e pesado Grande Tourisme francês meteu-se noutras aventuras, dividindo-se entre provas de circuitos, de velocidade e de resistência, eventos sobre o gelo, mas alcançado pouco ou nada de muito significativo. Presentemente, em face das poucas unidades de competição existentes, esses SM remetem-se a exposições estáticas ou a participações esporádicas em eventos de cariz histórico, de regularidade ou em versões clássicas dos ralis do antigamente, para deleite dos seus ainda inúmeros fãs.
SM em versões “Velocidade Furiosa”
1973 foi, também, o ano que viu a luz do dia um Citroën SM Michelin Proto, protótipo que, como indica o nome, foi desenvolvido em parceria com o gigante de pneus francês, à altura dono da Citroën. Objectivo: avaliar o quão longe se poderia ir em termos de potência de um automóvel de tracção às rodas da frente, equipado com um bloco V6 3.0 litros.
Claro que o motor original foi devidamente apimentado com uma nova admissão, árvores de cames e escape alterados e nada menos do que três carburadores duplos, para além de ter havido mexidas na patenteada suspensão hidropneumática. E esse longe foi de 300 cv, atingindo-se uma velocidade máxima de 285 km/h!
Mas o Citroën SM mais rápido do mundo seria outro, num recorde registado em 1987 do outro lado do Atlântico, no Bonneville Salt Flats, deserto salgado no estado norte-americano do Utah, quando uma versão do tipo drag Racing alcançou os 325,1 km/h. Curiosidade 1: a viatura-reboque era, também ele, um SM, naturalmente transformado para o efeito; Curiosidade 2: este recorde foi alcançado por uma mulher, de seu nome Sylvia Hathaway, batendo o máximo que o seu marido Jerry havia registado dois anos antes, de 321,8 km/h!
Fotos: Oficiais Citroën / Michelin / SM World