Choque eléctrico: O futuro próximo do automobilismo
É inegável, a electricidade está gradualmente a chegar ao desporto automóvel e, mesmo que muitos não se revejam nesse futuro ambiental, nada vai ser como até aqui! Não acreditas? Ou melhor, não queres acreditar que se irá perder toda a inigualável sonoridade e essência que emana dos motores a combustão, algo a que nos habituámos desde que somos gente e nos tornámos petroheads ou simples amantes das corridas.
Pois é… esse futuro está aí mesmo prestes a entrar-nos porta a dentro, sendo várias as razões, em especial as de índole ambiental, com o cada vez mais apertado cerco – nomeadamente na Europa – das regras de CO2, e que obrigam a que os carros, motos, camiões, etc. que correm em diversos campeonatos passem, cada vez mais, a ser o espelho dos veículos que cada um de nós pode adquirir no mercado. Afinal, o motorsport é, desde há muito, o laboratório vivo de muitos dos produtos que podemos comprar num qualquer stand e a oferta está cada vez mais electrificada!
Outra razão decorre do crescente e inegável sucesso que a Fórmula E regista, com cada vez mais seguidores, numa híper-competitiva categoria que se disputa com monolugares 100% eléctricos, em circuitos desenhados nos centros das cidades, pertinho do público, com poluição zero em termos de gases de escape e com quase zero em termos sonoros, pois os seus motores apenas emitem um já bastante reconhecível silvo. A comprovar esse case-study, após a actual Temporada 6 (2019/2020), a Fórmula E prepara-se para subir novo degrau já a partir do próximo biénio, fruto da atribuição, por parte da FIA, de um bem mais convincente estatuto de “Campeonato do Mundo”.
A reboque da Fórmula E, outros campeonatos estão prestes a (ter de) mudar a agulha e adoptar, de um modo mais ou menos gradual / imediato, a componente híbrida e/ou eléctrica aos respectivos regulamentos. Eis alguns exemplos!
It’s electrifying!!!
– A Fórmula E já faz bastante sombra à Fórmula 1, num gradual sucesso levou à cativação de uma dezena de construtores automóveis, dos 4 cantos do planeta – Audi, BMW, Mercedes-Benz e Porsche (Alemanha), DS Automobiles (França, integrando o português António Félix da Costa, que acaba de assegurar o título de Campeão de 2019/20 da modalidade), Jaguar (Inglaterra), Mahindra (Índia), NIO (China), Nissan (Japão) e Venturi (Mónaco) – para além das estruturas da britânica Virgin e da norte-americana Dragon, na esfera de Roger Penske.
Já a Fórmula 1 apenas tem 6 construtores, contando-se a Alfa Romeo, Ferrari, Honda, McLaren, Mercedes-Benz (veremos até quando) e Renault (idem), ora como fornecedores de chassis ou apenas de motores, neste último caso a entidades como a Alpha Tauri, Hass, Racing Point (que, em princípio, passará a Aston Martin em 2021), Red Bull e Williams.
O Mundial de Rallycross (World RX) vai primeiro arrancar com a estreia do “Projekt E”, que serve de base ao futuro escalão ‘eRX2’, de suporte ao campeonato principal, para já em paralelo com a série ‘RX2’, com motores a combustão. Para esta nova categoria a austríaca STARD tem vindo a desenvolveu o STARD Ford Fiesta ELECTRX, proposta 4WD, com 450 kW (612 cv) e 1.100 Nm e uma velocidade máxima de 240 km/h, a que me referi em edição passada. A estreia num palco do Mundial acontecerá em Holjes, na Suécia, em Agosto, no primeiro dos 6 eventos agendados para 2020, 3 deles duplos. Note-se que, apesar de Portugal também ter uma prova no calendário (10 e 11 Outubro), não é desta que veremos por cá os ‘eRX2’, reservando-se o programa de Montalegre às corridas do plantel ‘Super Car’ do Mundial, mais as do Europeu (‘RX Supercar’ e ‘RX Super1600’), para além de uma alguma componente nacional.
Comprovando-se o sucesso neste escalão intermédio do ‘eRX2’, seguir-se-á a ascensão da electricidade à categoria maior dos World RX, processo entretanto adiado para 2022 e em que todas as equipas terão usar o kit de electrificação da Kreisel Electric, e o suprimento de energia da GCK Energy, designados como fornecedores oficiais da FIA.
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O Mundial de Ralis (WRC) também já se sabe que vai entrar num modo híbrido em 2022 – em princípio com mecânicas térmicas nos troços e motores eléctricos nas ligações e restantes trajectos dos ralis – para mais tarde abraçar a vertente 100% eléctrica.
Não há certezas das marcas que irão disputar essa nova fase a baterias do patamar máximo das provas de estrada. Fala-se que as actuais Hyundai, MSport/Ford e Toyota estão a analisar a viabilidade, grupo a que eventualmente se poderá juntar ou a Skoda (esta fruto da sua integração no cada vez mais electrificado Grupo VW), ou até mesmo a própria marca do “automóvel do povo”. O potencial regresso da própria Citroën não é carta fora do baralho, marca que está a apostar forte na electificação dos seus modelos de estrada, isto caso a Opel não avance com o Corsa-e Rally a nível oficial, proposta apresentada recentemente e que poderá, também, ser usada em projectos privados.
O Mundial de Resistência (WEC) vai assentar, a partir de 2022, nos hypercars híbridos (categoria LMDh), estando já anunciada a participação da Peugeot e da Toyota, entre outras equipas com orçamentos mais significativos. Se, entretanto, a Aston Martin recuperar da desastrosa contabilidade dos últimos anos fiscais poderá assistir-se à reactivação do entretanto suspenso programa WEC, complementar ao que tem previsto para a F1. Haja dinheiro!
Relembre-se ainda o recente acordo entre o FIA World Endurance Championship e os norte-americanos do IMSA WeatherTech SportsCar Championship, que aponta à criação de uma série mista, composta por eventos icónicos, como as 24 Horas de Le Mans (França), as 24 Horas de Daytona (EUA), o evento de SuperSebring (EUA) ou Spa-Francorchamps (Bélgica), a série Petit Le Mans ou mesmo o icónico traçado de Silverstone, entre outras propostas presentemente em discussão.
O Pure ETCR é uma categoria, para já, de apoio ao Mundial de Carros de Turismo (WTCR), cuja estreia estava prevista para a edição deste ano, entretanto suspensa, do icónico Goodwood Festival of Speed (Inglaterra). Assim, essa première, à laia de demonstração, deverá ocorrer em Copenhaga (Dinamarca), num evento de clássicos a realizar em meados de Outubro, isto caso o coronavírus não volte a fazer demasiados estragos a norte da Europa.
Do plano actual do Pure ETCR fazem ainda parte duas batalhas integradas no WTCR 2020 (Aragón, Espanha, no final de Outubro, e Ádria, Itália, em meados de Novembro), palcos onde deverá ser possível observar um confronto directo, já a doer, entre veículos como o Cupra E-Racer ou o Hyundai Veloster N E-TCR, modelos que já se encontram em avançada fase de testes. Quanto à transição do próprio WTCR para este chocante domínio será uma questão de tempo… e de sucesso!
A série Extreme E de todo-o-terreno, cujas bases foram lançadas no pretérito Dakar, através do então ainda concept Odyssey 21, um projecto do tipo SUV que foi ali conduzido a fundo por Ken Block, numa demonstração esporádica que aproveitou os quilómetros finais, da última Etapa, do dito “mais duro rali do mundo” que agora tem os arraiais montados na Arábia Saudita.
A poder tornar-se realidade, este troféu eléctrico visitará 5 pontos icónicos do planeta – Lago Rosa (Senegal), Al Ula (Arábia Saudita), Kali Gandaki Valley (Nepal), Kangerlussuac (Gronelândia) e Pará (Brasil) – contando, à data, com 6 equipas inscritas (das 8 previstas pela organização), com a obrigatoriedade de ter de haver 2 pilotos por equipa de sexos diferentes!
NASCAR, Drift ou Drag Racing. Para uma potencial utilização nestas 3 vertentes de base norte-americana, a Ford tem em avançado estado de desenvolvimento um Mustang com mais de 1400 cv de potência, 1,000 kg de downforce a uma velocidade máxima de 257 km/h, permitida por nada menos do que 7 motores e um pack de baterias de ultra-elevada performance.
A estreia deste portento eléctrico Mustang Mach-E 1400, co-desenvolvido em parceria com a RTR Vehicles, poderá ter lugar ainda este ano, numa das jornadas previstas da série NASCAR, para um volante entregue, tudo indica, a Vaughn Gittin Jr, conceituado piloto/preparador que tem estado envolvido no processo.
Como se vê pelo exposto acima, é, definitivamente, electrizante o futuro do desporto automóvel! E sim, primeiro estranha-se, depois… depois entranha-se, como (quase) tudo nesta vida!
Fotos: Oficiais / Ford / Extreme E / Aston Martin Racing / FIA Formula E / DS Techeetah / STARD / Peugeot Sport / Toyota Gazoo Racing / Opel Motorsport / Pure ETCR