Cupra Leon e-Hybrid – Inteligência artificial
A curiosidade era muita. Vi muitos vídeos, li muitos ensaios e fiquei de “pé atrás”, logo à partida, com as primeiras conclusões com que me cruzei sobre o novo Cupra Leon e-Hybrid, uma versão híbrida do meu tipo de carro. Foram vários os nomes experientes do meio que lhe apontaram uma certa crise de identidade, confundida, esperava eu, com uma dupla personalidade de um híbrido desportivo e não de um desportivo que, por acaso, é híbrido.
Nunca esperei encontrar neste Leon Plug-in uma arma devoradora de curvas, embora, de certa maneira, o seja. Mas queria muito gostar deste carro, embora sabendo, de antemão, que não ia encontrar nele a pureza de um motor dois litros turbo, a gasolina, com 300 ou mais cavalos. Nem tão pouco o som grave e natural de escape que resulta da sua queima. Não, aqui não. Aqui a eficiência falou mais alto. Rápido, sim, e muito, mas com outras prioridades, mais prioritárias do que tempos por volta e velocidade de passagem em curva.
Decidi, por isso, avaliá-lo por aquilo que é, acima de qualquer outra coisa: um híbrido plug-in capaz de nos deixar com um sorriso na cara. E não me arrependi. Nem um bocadinho, pois assim conheci todas as camadas deste Cupra Leon. Desde o familiar confortável, espaçoso e bem equipado, capaz de percorrer, segundo a Cupra, 52 quilómetros sem emissões e ruído, até ao familiar menos confortável, mas igualmente espaçoso e bem equipado, capaz de acelerar e curvar de forma rápida, utilizando o seu pulmão adicional eléctrico para ajudar na performance.
Autonomia convence. Chassis aguenta mais
O Cupra Leon transforma-se ao toque de um botão, o de selecção dos modos de condução. No modo mais confortável, a suspensão adaptativa absorve quase tudo o que lhe possa aparecer no caminho, mesmo que não tenha uma grande ajuda dos pneus, borracha que com o seu perfil 35 está lá só a marcar presença quando o assunto é filtrar as irregularidades. Foi neste modo, e com uma condução pouco Cupra, que consegui superar a autonomia eléctrica declarada, esgotando a bateria ao fim de 57 quilómetros.
Mudando-se para o modo mais desportivo, ou fazendo all in com o modo Cupra, o Leon muda por completo, quase parecendo que estamos num carro diferente. De repente, tudo se sente, todas as vibrações da estrada nos chegam às mãos e às coxas, mesmo com os excelentes bancos de que dispõe, pois o Leon está muito mais tenso, mais rijo, com um amortecimento que anula movimentos excessivos da carroçaria e que lhe dá um comportamento dinâmico ao nível do que de melhor se faz no segmento, quer em agilidade, quer em segurança ao curvar.
Transmite, sempre, muita segurança, com um chassis de elevada competência, ainda complementado por electrónica que pode ser retirada de cena, parcial ou totalmente. E foi nesse modo intermédio do ESP que mais usufruí deste Leon, apontando-o às curvas com a sua direcção rápida e precisa, embora não muito informativa, aliviando repentinamente a pressão no acelerador ao mesmo tempo que um golpe de volante faz descolar a traseira, mantendo as rodas da frente como que colocadas sobre carris e obrigando-o a rodar sobre si mesmo, permitindo voltar à carga até à próxima oportunidade de sorrir a uns, teoricamente, pouco excitantes 60 km/h. Estou a ser rápido? Não faço ideia, mas estou a sorrir num híbrido.
E para ligar duas curvas consecutivas, o Leon conta com 245 cavalos e 400 Nm, valores que resultam da combinação do motor 1.4 TSI com o eléctrico e que são passados apenas às rodas dianteiras através da caixa DSG de 6 velocidades. E se os 225 km/h e 6,7 segundos de 0 a 100 km/h não deixam margem para dúvidas sobre o dinamismo deste Cupra Leon de ligar à tomada, há outros aspectos que merecem ser mencionados, não como crítica ao seu desempenho, mas como razões pelas quais considero que o Cupra Leon e-Hybrid não pode ser comparado com os seus antecessores que eram Cupra enquanto versão e não Cupra enquanto marca.
A dupla personalidade do Cupra Leon
Comecemos pelo motor, cheio de força a baixos regimes, mas cuja entrega é, por vezes, interrompida por ligeiras quebras de tracção provocadas pelo impulso adicional do motor eléctrico. As pequenas perdas de motricidade não chegam para retirar o Leon dos eixos, nunca senti isso, mas senti falta de ligação, de ainda mais linearidade na resposta, sensação que se prolonga ao pedal ao lado, cujo poder de travagem que acciona é indiscutível, mas cujo feedback da “mordida” inicial é corrompido pela travagem regenerativa, obrigando a um maior período de habituação na hora de dosear as travagens. Também a caixa DSG de 6 velocidades, com patilhas no volante, revela-se mais orientada para a eficiência do que para a dinâmica. Rápida a responder quando solicitada sob aceleração, não gosta de ser pressionada a reduzir depressa, retirando-nos confiança nas travagens mais exigentes.
Por tudo isto, não considero que o Cupra Leon tenha um problema de identidade. Tem sim, uma dupla personalidade, qualquer uma inteligente, e uma grande capacidade de transformação e adaptação, permitindo conduzir calma e eficientemente, ou desfrutar de um andamento que impressiona e de um chassis com “cabedal” para mais potência. Confortável para o dia-a-dia, rápido para o fim-de-semana. E por muito estranha que esta comparação possa parecer, o carro que imediatamente me veio à cabeça foi o excelente Civic Type R da Honda. Não pelos andamentos – que são incomparáveis – mas pelas abordagens. Uma mais rápida, mais pura e mais focada, a outra mais comedida, híbrida e, assim, mais pesada e artificial, mas ambas muito adaptáveis, com performance utilizável no quotidiano, sem compromissos ao nível do conforto, do espaço e do equipamento.
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A presença de um modo de condução configurável é uma enorme mais-valia deste Leon. Posso ter o motor no modo Cupra, a suspensão numa configuração mais branda para os tapetes negros rasgados do meu concelho de confinamento, e a direcção no modo intermédio Sport. O som artificial do motor é uma compensação pela ausência de som envolvente, pois as normas anti-poluição assim obrigam. Ainda bem que existe, é giro, mas não mais do que isso. Prefiro o barulho natural da mecânica, ainda que em pouca quantidade. O que dispenso, mesmo, são as ponteiras de escape da moda, que de ponteiras nada têm. E o que gostava, mesmo, era de o ver ligeiramente mais perto do solo, ainda com mais presença, com mais pose. E talvez com jantes de 18 polegadas, com um pouco mais de borracha lateral. Não há estradas para isto, e quando as há, há lombas pelo caminho, para deixarem de ser aquilo que eram para ser, estradas.
Ao fim de 300 quilómetros percorridos, e sem ter voltado a carregar a bateria depois desta ter esgotado ao fim de quase 60 quilómetros acumulados, deixei o Leon gerir a recuperação e utilização da energia, conduzindo ao ritmo normal do trânsito, interrompendo essa condução com alguns momentos menos comedidos. Ainda assim, devolvi a chave à Cupra com o computador de bordo a mostrar uma média de 7,5 l/100 km. Gostei, por isso, da relação andamento/consumo, pelo menos durante o meu ensaio, em que não me privei de usufruir da potência quando assim quis, mas no qual também incluí momentos mais relaxantes ao volante, de tejadilho aberto, música alta e braço na porta. Pode até não ser um Cupra com o qual nos liguemos de todas as vezes que nos sentamos ao volante, mas é um Cupra para todos os dias. Este não é um Cupra como os outros e esse é, talvez, o seu maior argumento.