A minha primeira vez… com um BEV!
Sabem aquelas situações com que todos nos vemos confrontados, em alguma parte das nossas vidas, sejam experiências de carácter mais íntimo, pessoal, social ou de índole profissional, a que nos referimos como “A minha primeira vez…”? Pois… o meu primeiro contacto mais intenso… perdão… mais extenso com um BEV (Battery Electric Vehicle, ou Veículo Eléctrico a Bateria em tugalês), processo que, decididamente, me marcou para todo o sempre.
Apesar da já (relativamente) ampla experiência no sector automóvel, a minha relação com as propostas 100% eléctricas manteve-se, até não há muito tempo, algo distante, obrigando-me o mais que pude a manter-me apegado aos motores tradicionais, que sempre foram parte intrínseca da minha vida. Claro que já tinha conduzido uns quantos carros eléctricos, embora percorrendo apenas uma mão-cheia de quilómetros, sem que tivesse de viver a experiência por dentro e como um todo, à semelhança do que sempre fiz com as bem mais comuns viaturas de motores a combustão ou térmicos. Só que, entretanto, deu-se a verdadeira estreia de ter de viver maritalmente com um deles, durante um período mais alargado de tempo, com tudo o que isso traz consigo…
Visita-nos no Instagram e segue-nos.
No que se poderá chamar de “um cliente muuuuuuuuuuito difícil” neste domínio, empurrei, tanto quanto possível, essa tal primeira vez no calendário, ainda que, muito naturalmente, esperasse que a coisa viesse a acontecer um dia. E eis que, uma vez chegado a vias de facto, vejo-me assaltado pelas eternas dúvidas e receios de quem nunca se vira verdadeiramente confrontado com esta inegável tendência bem real do mundo automóvel, sentimento que, decerto, partilham comigo alguns dos seguidores da Garagem.
Quem é que nunca olhou para um destes novos eléctricos – e a oferta é cada vez maior no grupo dos BEV que connosco se cruzam nas cidades e nas estradas nacionais – surgindo-lhe, de imediato, as já menos eternas questões ou, para quem for fã de “Trivial Pursuit”, as chamadas “Perguntas para Queijinho”: a primeira o inevitável “Que autonomia tem?”, seguindo-se o “Onde é que eu o carrego, se na minha rua [ou perto do meu trabalho] a oferta é mínima?”, ou o “E será que todos os carregadores servem?”, o “Como é em termos de manutenção?”, trazendo consigo dezenas de outras, levando, no limite, à final de “Será que eu comprava um automóvel eléctrico?”, aqui trazendo consigo a análise aos custos associados, aos preços e aos eventuais benefícios e incentivos fiscais, e bem como ver da necessidade de uma wallbox, isto dependendo da habitação / local de trabalho que se tenha.
São, todas elas dúvidas / questões perfeitamente válidas em face do que, ainda hoje, os consumidores se deparam, isto apesar da cada vez maior popularização eléctrica do automóvel neste nosso Portugal, ouvindo-se e lendo-se, a cada dia, que muito em breve os consumidores da Velha Europa vão ter mesmo ter de apostar na electricidade automóvel, relegando gradualmente para um passado cada vez mais distante as propostas que até há bem pouco tempo tinham o (quase) monopólio do mercado.
Assim sendo, o medo e as desconfianças vão dando lugar a uma gradual electrificação do colectivo e, com isso, com uma normalização / habituação aos processos. O nosso país demonstra-o com um gradual crescendo do volume de aderentes e das diferentes infraestruturas de carregamento, entre operadores e capacidades, instalações que se inauguram em estações de serviço, em parques de estacionamento de áreas comerciais, estações de carga ou em pontos específicos das nossas cidades e vilas (por enquanto as aldeias e os lugarejos estão fora da equação), se bem que, aparentemente, ainda não em número suficiente, ainda não acompanhando o rácio de viaturas BEV já em circulação.
E eu que o diga, pois perto de minha casa, conto apenas com uma espécie de “serviços mínimos”: dois carregadores a 450 metros da habitação, um da Galp, outro da Mobi-e, ambos do Tipo 2. Tirando esses, a alimentação do meu teorético BEV só se poderia fazer a mais de 2 km, podendo optar por um dos quatro carregadores de uma estação PowerDot, com diferentes capacidades (a 2,3 km), por outro da KLC, com três postos com diferentes velocidades de carga (a 2,8 km), e ainda outro da Galp, Tipo 2, já a 3,3 km de onde moro. E é tudo!
Não estou a pedir que nasçam como cogumelos, como os ecopontos, em cada esquina ou cada final de rua / avenida – se bem que, vendo bem a coisa, não seria nada mal pensado – mas digamos que a sua distribuição ainda é manifestamente reduzida, para uma zona residencial já com umas décadas, com algum comércio, onde a maioria não têm garagens, à excepção dos moradores dos condomínios fechados, onde cada um poderá ter a sua wallbox, assim a queira instalar.
Quando a bateria começa a dar mostras de esgotamento, durando mais ou menos em função das opções eléctricas que se liguem a bordo (ar condicionado, emparelhamento de telemóveis, etc), do tipo de condução de cada um, nomeadamente da força exercida no pedal do acelerador, a nossa preocupação cresce de modo inversamente proporcional à velocidade que a percentagem da autonomia da dita vai descendo, chegando ao ponto de quase termos de andar com o carro ao colo, pelo menos até que nos habituemos à realidade e a esta nova rotina.
E o que tem que ser tem muita força!
Tido como um dos países com cada vez maior e crescente adesão à moda eléctrica, Portugal vive uma realidade que tem crescido significativamente em termos de compradores de BEV. É, não só de destacar o impressionante salto de 70% nos volumes de matrículas de 2018 para 2019, percentagem que só não teve expressão maior nos dois anos seguintes devido à ainda instalada era COVID-19, como o facto de termos sido, em 2020, o 8º maior mercado BEV a nível mundial, em quota (13,5%), só tendo à nossa frente 6 países nórdicos, a Holanda e a Suíça!
Nestes atípicos anos de 2020 e o presente 2021, o mercado demonstra que os portugueses estão mesmo a virar a agulha para a electricidade, registando-se novos crescimentos nesse mercado BEV – que já vale, por si só, cerca de 6% do bolo total, sem contar com os híbridos plug-in – números que deverão reforçar-se nos meses vindouros, agora que saímos do último confinamento e esperando-se que o Outono/Inverno não nos traga novos dissabores.
Fruto de uma crescente oferta de novos modelos, em diferentes segmentos e com autonomias variáveis, e mesmo da estreia de algumas marcas neste domínio, os consumidores portugueses viram cada vez mais as costas às propostas 100% térmicas (gasolina e diesel), mercado que regride de um modo significativo face ao domínio exercido não há muito tempo, nomeadamente as propostas a gasóleo, outrora rainhas e senhoras do sector.
Clica aqui para fazeres o download grátis da Revista Garagem
Naturalmente que o período de Janeiro a Maio do ano passado e os mesmos 151 dias do presente ano não se podem comparar com a habitual precisão, fruto dos diferentes condicionamentos decorrentes dos Estados de Emergência a que Portugal esteve sujeito: em 2020, o primeiro iniciou-se a 16 de Março, prolongando-se até 2 de Maio; 2021 arrancou já sob essa realidade (implementada em Novembro) mantendo-se os stands fechados até 30 Abril. Mesmo o exercício comparativo dos meses de Maio de 2020 e 2021 se deve fazer com as devidas cautelas, mesmo que o deste ano tenha sido foi o 7º melhor mês de sempre nas vendas de propostas 100% eléctricas no nosso país!
Segue-se, agora, um período de Verão cujo mercado poderá ser mais quente do que é hábito, seguindo de um final de ano em que as marcas fazem sempre aquela ginástica orçamental e de muy atractivas promoções, de modo a venderem mais um carrito, quiçá para uma prenda de Natal! Antecipa-se, assim, que alguns BEV possam ser vendidos não ao preço da uva mijona mas pelo menos ao de uma boa casta!
Para já, com esses 5 meses contabilizados (o presente Junho ainda está por somar), os grandes protagonistas do mercado são, por esta ordem, o Nissan Leaf, Tesla Model 3 e Peugeot e-2008, um top-3 a que o Renault Zoe e o Peugeot e-208 querem ascender. O grupo dos 10 Mais completa-se com o Hyundai Kauai Electric, Volkswagen ID.3, Citroën ë-C4, Mercedes-Benz EQA e FIAT 500 Electric.
Quanto a mim e sem querer influenciar quem quer que seja, a questão da autonomia mantém-se a minha maior preocupação nesta temática dos BEV. A tecnologia associada às baterias está mais do que comprovada, os benefícios ambientais também o estará – pese embora a análise well-to-wheel por vezes não se mostre assim tão líquida –, as tecnologias de apoio à condução, o conforto e o espaço a bordo (bagageira incluída) não se prejudicam face às equivalentes versões térmicas, até já havendo exemplares com maior sonoridade, ou que replicam parte do som dos modelos a combustão, entre outras soluções que, gradualmente, vão enriquecendo a oferta.
Ou seja, o automóvel em si mantém-se quase igual – okok… é um quase relativo – excepto na hora de ir à bomba, melhor dizendo ao posto de carregamento, como todos aqueles que, como eu, vivem num andar e que não podem instalar uma wallbox em casa, em áreas residenciais onde a capacidade instalada não é a ideal para o número de viaturas já aí existentes. E mandar uma extensão de XX metros pela janela digamos que… enfim, adiante! Isto já para não falar no facto de que, se não houver carga suficiente para enfrentar, de imediato, uma urgência de última hora, essa situação torna-se complicado, pois não é só ir ali meter uns litros para desenrascar, sendo precisos, em alguns carregadores, uns largos minutinhos para se ter uma carga que faça jus ao nome.
Assim, enquanto a coisa não evoluir em termos de infraestruturas nas zonas residenciais, não contem comigo! Não concebo ter de estar o tempo todo a olhar para o painel de instrumentos e observar a carga disponível e a autonomia anunciada cair a uma velocidade inversamente proporcional – isto sem exagerar na exigência ao bicho eléctrico – ao número de quilómetros percorridos, para depois ser obrigado a deixar esse mesmo papa kW a múltiplos metros / quilómetros de casa a carregar, tendo de ir para a dita a pé, ou com a ajuda de um TVDE. Se / quando for o caso irei primeiramente optar por um plug-in híbrido, pelo menos até que a envolvência 100% BEV se torne minimamente sustentada!
Fotos: Garagem / Oficiais