Há mares e oceanos famintos por automóveis
Ao nível do transporte intercontinental, o preferido pelos grandes construtores automóveis assenta no conceito marítimo, recorrendo-se aos grandes cargueiros das mais conceituadas companhias, algumas delas até detidas pelo grupo industrial que algumas integram. Se a grande maioria chega aos destinos com a carga intacta, outros casos há – e não são tão poucos quanto isso – em que o lote é engolido pelos mares e oceanos, coleccionando uma impressionante quota de veículos e dando grandes dores de cabeça às seguradoras!
Fruto da inclemência marítima, devido a avarias ou por manifesto erro humano, ao longo dos tempos têm-se registado uns quantos casos de embarcações de transporte exclusivo de veículos que, de um momento para o outro, se vêem impedidas de chegar ao porto de destino. Se umas ainda conseguem ser resgatadas, rumando a operações de recondicionamento ou para uma espécie de autópsia post-mortem, retirando-se das suas entranhas uma carga com danos variáveis, outras vêm-se arrastadas definitivamente para o fundo dos oceanos, para não mais serem vistas. Eis alguns exemplos, casos do presente Século XXI, ocorridos em alguns casos, imagine-se, a cada dois ou três anos!
Tricolor (2002), Hyundai 155 (2004) e Cougar Ace (2006)
Recuemos à manhã do dia 14 de Dezembro de 2002, dia em que o porta-contentores Kariba foi de encontro ao cargueiro norueguês MV Tricolor, quando se cruzaram no Canal da Mancha, fazendo com que este afundasse em 30 minutos, levando consigo 2.871 viaturas novinhas em folha, entre modelos da BMW, da Volvo e da Saab. Seguiu-se um longo processo de recuperação da embarcação, que está aqui resumido. Cerca de dois anos depois, a 22 de Maio de 2004, o imponente Hyundai 105 colidia com um petroleiro no Mar da China, no Estreito de Singapura, ditando o destino de 3.000 Hyundai e Kia, a que se juntaram 1.000 viaturas usadas de marcas japonesas.
E eis que, mais dois anos passam, chegando o dia 23 de Julho 2006, data em que o imponente cargueiro Cougar Ace se meteu em sarilhos. Na viagem que o levaria de Hiroshima à costa oeste dos EUA, destino onde já não chegaria, deu-se uma mal sucedida operação de troca de lastro, pelo que a embarcação de 200 metros de comprimento e 55.000 toneladas de peso começou a adornar, ficando praticamente deitada de um dos lados. O golpe deu-se ao largo das ilhas Aleutas, num Mar de Bering que até se mostraria algo clemente, não interferindo nas posteriores operações de resgate, na tentativa de colocação do barco de novo em posição, permitindo o seu reboque para terra. Já a carga, cerca de 4.700 Mazda e de uma centena de comerciais Isuzu, distribuídos pelos seus 14 decks, não teve salvação, tendo de ser destruída devido aos danos, em muitos casos consideráveis!
Baltic Ace (2012), Hoegh Osaka (2015) e Golden Ray (2019)
Tipicamente complicado em termos de condições de navegação, o Mar do Norte voltaria a ser palco de outra colisão, esta ocorrida a 5 de Dezembro de 2012 e que selou o destino do Baltic Ace e da sua carga, aqui composta por 1.400 viaturas Mitsubishi. Saira de Zeebrugge, na Bélgica, e tinha como destino Kotka, na Finlândia, onde não chegaria fruto dessa colisão com o porta-contentores Corvus J. Encontrando-se a apenas 35 metros de profundidade e revelando-se um perigo para a navegação, foi decidida a sua remoção, um longo processo a que pode assistir aqui.
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Outro incidente de dimensões consideráveis envolveu o Höegh Osaka, na madrugada do dia 3 de Janeiro de 2015, também aqui uma embarcação com uns consideráveis 180 metros, que iniciara o percurso entre Southampton (Reino Unido) e Bremerhaven (Alemanha), mas não indo muito longe. Ficou atascada logo no Bramble Bank, nas imediações da Ilha de Wight, sendo que do seu manifesto de carga constavam 1.400 viaturas premium, das marcas Jaguar, Range Rover e Rolls-Royce, bem como autocarros e equipamento de construção. Na sequência da sua remoção do local e reboque para o porto de partida, esse valioso conteúdo foi-lhe retirado, sendo, neste caso em particular, apenas parcialmente destruído, incidindo nas viaturas que se encontravam nos decks inferiores, que se viram inundados.
O caso mais recente remonta a Setembro de 2019, quando o também gigante Golden Ray encalhou e adornou na costa de Brunswick, no estado norte-americano da Georgia, perto de Saint Simons Sound, transportando, consigo, mais de 4.000 viaturas das marcas Kia, Chevrolet, GMC, GM, Mercedes-Benz e RAM. Decidiu-se, então, que a imensa massa de aço e respectivo conteúdo teria de sair dali, de modo a livrar a área marítima de males maiores, processo que ainda decorre. Feita a extracção do combustível e outros líquidos a bordo, iniciaram-se as operações de corte, dividindo-se o barco em 8 secções, numa imensa operação que ainda decorre, atrasada face ao previsto, fruto da passagem de furacões, dos protocolos decorrentes da pandemia de COVID-19 e de um incêndio de grandes proporções que, entretanto, deflagrou, quando cortavam a 5ª das 8 secções, ou até mesmo devido a acções de… sabotagem!
Os futuros mega-cargueiros verdes da Höegh Autoliners
Presentemente, as grandes operações de logística intercontinental continuam a fazer-se com recurso a super-cargueiros, exemplares cada vez mais robustos, tecnológicos e até amigos do ambiente, como as futuras embarcações da Classe Aurora, da Höegh Autoliners, empresa que se encontra a acelerar os seus esforços de descarbonização, apontando às zero emissões no transporte marítimo.
Propulsionados por enormes conjuntos mecânicos multi-combustiveis – do gás natural liquefeito, ao recurso à amónia verde – foram desenhados para transportar a chamada carga do futuro, numa referência à sua própria electrificação, nomeadamente através de dezenas de painéis solares, potenciamento o carregamento da carga transportada. Poderá receber o equivalente a 9.100 viaturas, tornando-se, uma vez baptizado e colocado nos mares no final de 2023, no maior do género no planeta. Visite-o aqui.
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Mas a componente humana continua a ser um importante factor de risco, já para não falar da inclemência de uma Mãe Natureza que, de quando em vez e sem avisar, lá se lembra de coleccionar mais uns quantos exemplares…!
Fotos: Oficiais / Porto de Setúbal; National Digital Library of the US Fish & Wildlife Service; US Coast Guard; Hoegh Autoliners; Koole BV