Volkswagen Golf R – Às quatro, na serra
Começo por repetir-me. Um desportivo como o Volkswagen Golf R, aos meus olhos, não cumpre com a receita tradicional de um hot hatch. Não por falta de ingredientes, mas por tê-los a mais. Neste caso, falo da tracção integral. Por isso tentarei avaliá-lo por aquilo que é, mais do que qualquer outra coisa: um desportivo compacto com tracção às quatro rodas e que por acaso é um Golf, um dos eternos hot hatch da história do automóvel com os seus GTI. Começo também por assumir que gosto do Golf. Não do jogo, que não sei se gosto assim tanto porque nunca joguei, mas do Volkswagen. E gosto muito de “Golfs” rápidos, os míticos GTI que só recentemente tive a oportunidade de conduzir. Este “azulão” é ainda mais rápido e embora não tenha as três letrinhas mágicas a acompanhar o seu nome, tem um já consagrado R, quer em estrada, em várias gamas da marca alemã, quer nas classificativas do WRC, através do multicampeão Polo R. Um simples R, mas com muito significado. Aprecio essa compacidade do nome. Não estamos na presença de um Golf GTI-R Evo RS Edition Nurbürgring Wörthersee Special. É um Golf R. Ponto.
Motor cheio, tracção inquebrável
Esteticamente, não é o meu Golf preferido, mas esta oitava geração está longe de ser feia. Até porque não me recordo de um Golf de que não goste, seja uma geração ou uma versão, desde o seu lançamento em 1974. Mas com a decoração R, a Volkswagen não só conseguiu destacá-lo do icónico GTI, como introduziu uma quase perfeita proporção entre emoção e razão no seu visual. Não é um Golf como os outros e isso nota-se de imediato, mas não destoa da paisagem quando estacionado à porta do restaurante “in” do momento. Aquele que está sempre cheio, onde se degusta um fantástico bife de 10 gramas, acompanhado de um tapete de verduras colhidas com luvas de algodão tibetano, pinceladas com azeite armazenado numa cave húmida e fria, feito a partir de azeitonas de oliveiras plantadas de olhos vendados. E de costas. Por monges. Do Tibete, também, como o algodão. Acho que já perceberam a ideia. O Golf R é um desportivo, mas tem muita classe, é chique. Um fast chic, vá!
Por dentro, e começando pelo menos bom, esta nova geração de modelos do grupo aposta na centralização da maior parte das funções no ecrã táctil. E de uma forma muito resumida, não aprovo. Assim como não aprovo a quantidade de botões no volante. Ao fim de 2 minutos a andar depressa, tinha já as mãos suadas, mais do que normal, pois liguei, sem querer, o aquecimento do volante. Desnecessário. Por outro lado, e passando às coisas positivas, o R mantém praticamente a mesma habitabilidade e o mesmo conforto de um Golf convencional. Os bancos são desportivos (e bonitos!), mas sem apoio lateral exagerado, o que é uma boa notícia para as longas viagens em que o consumo do motor 2.0 litros turbo surpreendeu. Em autoestrada, conseguimos manter a média abaixo dos 7,5 l/100 km. Em cidade, contem com mais 2 l/100 km. A caixa DSG, em combinação com uma afinação mais branda da suspensão com amortecimento variável, dão um enorme contributo para que seja possível viver com o mais potente dos Golf no quotidiano. Mas o que importa, aqui, não são os ritmos calmos, cenários em que o Golf, por mais potente que seja, sempre soube comportar-se e estar à altura das exigências. O que importa é o que vem a seguir…
R de rápido, R de radical
O motor é fantástico, começando desde cedo a mostrar toda a sua disponibilidade, acompanhada pelo sonoro sopro com que começa a encher antes dos 320 cavalos nos colarem ao banco. A subida de rotação é rapidíssima, estando a caixa DSG sempre preparada para passar à relação seguinte, numa escalada contínua que rapidamente nos coloca no lado dispendioso da lei. A caixa pode também ser controlada pelas patilhas no volante, suportando reduções múltiplas ao mantermos a patilha esquerda pressionada. Modos de condução pré-programados são três: Comfort, Sport e Race. O melhor é o modo personalizável Individual, que me permitiu ter o Golf R perfeitamente configurado para as minhas estradas de eleição. Motor em Race, direcção em Sport, som de escape Pure (sem artificialidades) e a suspensão num meio termo entre Comfort e Sport, absorvendo melhor as imperfeições das estradas secundárias e evitando desequilibrar o chassis nos momentos mais exigentes, em apoio. Para testar um pouco das capacidades naturais do Golf R, com esta minha configuração, desliguei por momentos o sistema ESC e lancei-me a umas curvas na serra de Sintra, cenário onde outros desportivos “às quatro” brilharam em tempos.
Começando pelos travões, impressionam pela mordida agressiva e confiante, bem como pela segurança que transmitem ao desacelerar o Golf, ainda que tardiamente e a velocidades elevadas. Gostei da firmeza do pedal, mesmo após várias travagens fortes, sendo fácil de dosear a pressão ao entrar em curva. Para a segunda metade, à saída desta, num gancho relativamente apertado, já com a frente bem posicionada e com a “segunda” pronta a ser esticada com acelerador esmagado, apontei à saída a fundo, deixando que a tracção integral inteligente revelasse toda a sua magia. E revelou. Rápido a acelerar como poucos, o R saiu disparado com uma momentânea subviragem que, das duas, uma: ou nos convida a aliviar um pouco o acelerador ou a “abrir” ligeiramente a direcção. Mantive o pé a fundo e a confiança na electrónica para resolver o ligeiro desvio da trajectória e foi o melhor que podia ter feito. Em menos de nada senti a traseira rodar sob aceleração, numa ligeira deriva de sobreviragem denunciada pelo chiar dos Goodyear ao oporem-se à força centrífuga que empurrava o Golf para fora, mas que não só não me abrandou, como tirou o Golf para fora da curva num piscar de olhos, anulando qualquer vestígio de escorregamento do eixo dianteiro. Curiosa é, também, a sensação de sermos empurrados e não puxados até à próxima curva, algo perfeitamente notório numa situação destas. Zero perdas, potência toda no chão, bem distribuída.
Nas zonas mais rápidas, e com asfalto praticamente novo, pude experimentar o Golf R com a suspensão na sua configuração mais decidida e confirmar o que esperava encontrar. Um maior controlo dos movimentos da carroçaria entra em cena, ajudando também a manter a borracha colada ao alcatrão. A velocidade de passagem em curva impressiona, mas a eficácia é de tal maneira elevada que a experiência pode até parecer pouco emocionante. Isto até olharmos para a velocidade a que o Golf finta a física. A “comer” quilómetros, mesmo com curvas e troços mais sinuosos pelo meio, o Golf R será um osso muito duro de roer, mesmo por outros desportivos teoricamente mais focados na performance.
Gostei mesmo muito do Golf R, dono de uma eficácia e rapidez inquestionáveis, possíveis pela presença da tracção às quatro rodas, cujo contributo deverá ser também interessante de perceber em condições de aderência mais limitada. Consegue curvar sobre carris, mas acabou por se revelar mais solto de movimentos, mais ligeiro e ajustável do que eu esperava encontrar. Com estes opcionais, como as jantes de 19 polegadas e o possante escape Akrapovic, o preço fica ali perto dos 64.000 € e deixa-o longe de ser um desportivo para o comum dos mortais. Mas apesar do salto em desempenho e performance, continua a ser um Golf como os demais, algo que o GTI também sempre fez. Com classe e, até, alguma indiferença, este R eleva a fasquia a um patamar absolutamente viciante. Um tremendo Golf. Um tremendo desportivo.