The Italian Job – Parte 2 – Turim, Heritage Hub, Mirafiori
Como sabem, a Garagem esteve “de férias” em Itália. E digo “de férias”, entre aspas, porque a Garagem não é um trabalho, pelo menos daqueles chatos, embora nos consuma tempo e cabelo, é algo que fazemos com imenso prazer, mesmo em tempo, dito, de férias. Apontámos, assim, a Itália para ir conhecer o Museo Storico Alfa Romeo em Arese, numa história que podem ler – ou reler – ao clicar aqui. No entanto, ainda na fase dos preparativos para esta muito aguardada viagem, em conversa com os responsáveis da Alfa Romeo em Portugal, foi-me dito que embora ainda não estivesse aberto ao público, havia a possibilidade de estender as minhas férias a Turim para ficar a conhecer outra Meca – em Itália há várias – dos petrolheads, neste caso, o fantástico Heritage Hub. Um enorme pavilhão onde o braço italiano da Stellantis, a FCA, guarda a sua inestimável colecção de automóveis.
A curta viagem de metro e a pequena caminhada que separavam o meu hotel em Turim do Heritage Hub foi substituída por algo com muito mais estilo, o Alfa Romeo Giulia do responsável de Comunicação do Departamento Heritage, Umberto Hardouin, que fez o favor de me dar uma boleia ao melhor estilo italiano. Depois de ultrapassada a segurança do complexo de Mirafiori, o Giulia parou mesmo em frente à entrada do Hub, uma visão que tinha bastante presente das várias fotografias que fui vendo ao longo dos últimos meses. Mas desta vez era real, não era uma imagem no monitor do computador onde escrevo este mesmo texto. Eu estava em Mirafiori e a uns escassos vinte metros de todo aquele património automóvel. São mais de 300 carros, protegidos num espaço – outrora a Officina 81 de Mirafiori – onde não só estarão, em breve, expostos de uma forma que faça justiça à sua importância, bem como onde a direcção pretende realizar outro tipo de eventos, desde workshops, convívios e até, imagine-se, pequenos concertos de jazz.
Por onde começar?
Passar as portas e ter um primeiro vislumbre da imensidão e riqueza daquele espaço foi como levar um possante e sonoro estaladão na cara. Estava, assumidamente, desorientado, mas felizmente foi-me feita uma primeira visita guiada, bem como me foi explicada que a disposição final dos carros estava ainda a ser estudada. Tal como as grandes faixas penduradas da cobertura indicam, o Heritage Hub está em construção, e por isso, pediram-me, igualmente, compreensão pelo pó que alguns modelos tinham. Como podem imaginar, foi um problema muito complicado de ultrapassar e ponderei não realizar a visita…em três horas, como me foi pedido. Por mim, passava ali o dia, mas a agenda do Hub estava preenchida com outros trabalhos e visitas de jornalistas, pelo que apenas tive oportunidade de cumprimentar Roberto Giolito, Director do departamento Heritage da FCA e o responsável pelo design de modelos como o FIAT Multipla, com um breve “ciao” e um “grazzie” pela oportunidade de estar naquele espaço. Com tempo, a conversa teria sido incrivelmente interessante, pois gostava que ele me explicasse como é possível que, actualmente, goste de me cruzar com um Multipla na rua.
Não posso, obviamente, falar com detalhe de todos os automóveis que ali vi. Não posso, sequer, mencioná-los todos. Mas tentarei, na medida do possível, descrever um pouco do muito que ali vi, num sítio a que terei de regressar, inevitavelmente. Comecei por ver de perto dois carros que não podiam ser mais diferentes. O estudo EVC2, com o motor Triflux, desenvolvido para substituir o Delta S4, e o concept do Fulvia, uma moderna interpretação do que poderia ter sido o eterno modelo da Lancia na actualidade. Por ali estavam, igualmente, diversos carros dos Carabinieri, onde até o mais actual, um Punto da primeira geração em versão base, tinha imensa piada. Estudos e concepts com base no Panda eram imensos, inclusivamente um que mais não era do que uma carroçaria assente numa estrutura tubular com a base rolante de um tractor, um pequeno monster truck para a cidade.
Números mágicos: do 600 ao 037
Ter estado ao lado do primeiro 600 produzido foi, também, um momento especial. Original e gasto pela passagem do tempo, não esconde os anos que tem no desgaste da pintura da sua carroçaria e na humidade que se instalou no seu interior. Está perfeito assim. Perto dele, o primeiro 126 produzido na fábrica de Cassino. E já que estamos numa de FIAT, que bom foi ver, todos juntos, exemplares praticamente novos de modelos do meu tempo: Cinquecento, Seiscento, Punto GT e 188, Barchetta, Croma, Bravo, Tipo, Coupé, Multipla…A lista é interminável. A Alfa Romeo estava bem representada, com alguns 4C, 8C, Giulietta e SZ, por exemplo, mas com um museu exclusivo, não é, de todo, a marca mais presente no Heritage Hub. Essa marca, quer-me parecer, é Lancia.
Foi por esta altura, ainda com a visita a cerca de 25%, que o simpático Umberto me perguntou qual era o meu plano e me alertou para a agenda apertada do Hub, pelo que seria melhor acelerar o passo e assim conseguir ver tudo. Foi o que fiz, e apontei à Abarth e a algumas das máquinas do mundo da competição que por ali estavam, desde um 124 Spider Abarth a um Lancia 037, passando ainda por um magnífico Stratos. Isto para mencionar apenas alguns, poupando-vos à longa descrição de tudo o que de maravilhoso havia naquela secção central menos preenchida. Para o fim ficou aquela que me pareceu, como referi, a marca do grupo mais representada, a saudosa Lancia. E o melhor é, simplesmente, enumerar alguns dos modelos e deixar que as fotografias vos transmitam aquilo que por palavras é difícil de pôr. Y e Y10, Delta, Dedra, Prisma, Fulvia, S4 e Thema. Só estes bastariam, carros que marcaram a minha geração, mas há por ali muito mais pontos de interesse.
Terminei a visita num tempo recorde de três horas, tentando não interferir com os compromissos agendados pela equipa do Hub para aquela tarde. Deixei a colecção com a mesma sensação com que me preparo para terminar este texto, a de que algo ficou por fazer. Lá, por ver e absorver, aqui, por dizer e transmitir. Aproveitei o máximo que pude uma oportunidade que não sei quando se repetirá, isso tentei fazer. E já de regresso ao Giulia do Umberto, e porque há sempre mais qualquer coisa relacionada com automóveis para ver em Turim – uma maravilhosa cidade também para quem não é doente por automóveis como eu – pedi-lhe um último favor: “Em vez de regressar ao hotel, pode, por favor, deixar-me em Lingotto?” Uma vez mais, dei por mim a bordo de um “Alfa”, a fintar o trânsito como só um condutor italiano sabe. Que dia! E que “férias”!