Aiways U5 – A minha experiência de 24 horas com o SUV chinês
São inúmeras as ocasiões e imensos os comentários, nas mais variadas áreas tecnológicas, em que se admite a inevitabilidade da implantação dos produtos oriundos da China no mercado europeu. E o sector automóvel não é, obviamente, excepção, até porque se há país onde a transição energética do automóvel para uma base electrificada está a crescer de forma impressionante, esse país é a China.
Não é por isso de estranhar que o primeiro modelo chinês à venda em Portugal seja 100% eléctrico e também que o formato de carroçaria escolhido seja, inteligentemente, o de um SUV. A Aiways, uma start-up fundada em 2017, é uma marca plenamente focada em modelos 100% eléctricos que chega ao nosso país pela mão da Astara – o mesmo nome que importa, por exemplo, os automóveis KIA – e o seu primeiro modelo, que podes já hoje comprar em Portugal, é este SUV U5.
A Aiways promete, inclusivamente, lançar no mercado cerca de 15 modelos distintos, todos eles assentes sob a mesma plataforma, nos mais variados formatos. Dos SUV aos MPV, passando ainda pelas berlinas e crossovers urbanos, a Aiways trouxe recentemente até Portugal o concept U6 ION, estudo que antecipa um futuro modelo de silhueta SUV coupé – com apresentação prevista para o terceiro trimestre deste ano – e que promete uma autonomia entre os 500 e os 650 quilómetros, consoante a capacidade de bateria instalada. Nos planos está, também, o monovolume U7.
Para já, a Aiways concentra os seus esforços iniciais no território nacional com este U5, um SUV familiar que ambiciona conquistar clientes a modelos como o Skoda Enyaq e o Volkswagen ID.4, com os quais partilha dimensões equivalentes, mas também a outras propostas do segmento abaixo, modelos com os quais partilha valores idênticos de capacidade de bateria. Está já disponível em Portugal, mas com entregas (limitadas) previstas apenas para o mês de Junho. A Astara está, também, a desenvolver a sua rede de agentes Aiways a nível nacional, através dos quais irá comercializar os seus modelos – e também online – bem como prestar serviços de após-venda.
Design
Gostos não se discutem, bem sei. E o facto de um produto ter um design orientado para o consumidor oriental, não tem necessariamente de ser algo mau. O que dirão os chineses dos nossos automóveis de estilo assumidamente europeu? Ainda assim, ao olhar para o Aiways U5, não me ocorre, de todo, a ideia, seguida de conclusão, de que este é, claramente, “um automóvel chinês”. No entanto, e embora lhe reconheça um ou dois pormenores originais, como a iluminação e os puxadores embutidos na carroçaria, o U5 sofre do mesmo mal de muitos SUV europeus: algum anonimato. E essa falta de identidade fica a dever-se, em grande parte, à ausência de uma grelha (veja-se o caso do original Hyundai Kauai, quando comparadas as versões térmicas e eléctrica).
As bonitas jantes de 19 polegadas ajudam a compensar o seu exterior algo “despido”, onde, tenho a certeza disso, era bem-vinda uma cor mais quente e apelativa do que o branco da moda. Para além desta, a Aiways propõe outras três cores para a carroçaria, bem como ambientes claro ou escuro para o habitáculo. Importa ainda referir que o U5 é maior do que parece, pelo menos aos meus olhos, medindo praticamente 4,7 metros de comprimento e ocupando 1,865 metros da largura da faixa de rodagem, embora, como veremos abaixo, não seja, de todo, intimidante de conduzir em ambiente urbano. Em altura mede 1,70 metros e pode, por isso, andar nas diversões indicadas para os adultos. É bastante alto, entenda-se.
Interior
Passando ao habitáculo, e baseando-me apenas nas primeiras sensações – quiçá, as mais importantes e conclusivas – não me senti a bordo de um automóvel chinês, signifique isso o que significar aos “olhos” dos mais desconfiados. Há, obviamente, algumas soluções estéticas duvidosas (as pegas das portas, por exemplo), tal como as há em muitos automóveis puramente europeus ou apontados ao velho continente. No geral, após os primeiros minutos a bordo, senti-me bem, principalmente pela muita luz natural que os grandes vidros deixam entrar. Como é hábito, o habitáculo combina materiais mais agradáveis ao toque com outros menos simpáticos ao teste da unha, mas gostei de ver, por exemplo, que os espaços de arrumação nas quatro portas são forrados a alcatifa. A minha principal dúvida, uma que sempre se impõe, na verdade, é a durabilidade de alguns dos materiais, desconfiança ainda aumentada pelo pontual exagerado odor a plástico.
Porta-luvas não existe, mas para compensar a sua ausência, o U5 oferece um grande espaço de arrumação ao centro, debaixo da consola flutuante. Não gosto da solução, mas, verdade seja dita, não gosto em praticamente nenhum outro modelo que também a tenha, porque o acesso é sempre complicado. Algo que também não aprovo é a colocação do botão dos quatro piscas no tejadilho, junto do botão SOS que, obviamente, pressionei sem querer. Se o telefone tocou em Xangai, peço desculpa, mas foi engano. Está tudo bem, estava “só a testar” se funcionava. Voltando à consola central, esta inclui um original painel táctil – com feedback por vibração, basculante, que esconde espaço com soluções de carregamento – com os controlos da climatização, mas onde não surge indicação da temperatura seleccionada. Esta aparece no ecrã do infotaiment, onde a climatização pode, também, ser controlada. O ecrã do sistema está bem colocado e tem boa definição, mas não se pode dizer que esteja recheado de funcionalidades. Não tem navegação, mas a Aiways refere que é propositado, uma vez que é essa a tendência, a de integração com as aplicações de smartphones. A imagem proveniente da câmara traseira convence pela positiva e a partir do ecrã podemos, também, controlar a abertura da cortina e do tejadilho panorâmico em vidro.
Não preciso de o fazer para garantir que viajar no banco de trás do Aiways U5 é uma experiência confortável. O acesso é, desde logo, facilitado pelas grandes portas e já a bordo, o piso é totalmente plano. Em largura, pode até não ter a dimensão suficiente para que três adultos não levem o caminho a raspar ombros uns nos outros, mas o espaço para pernas, esse, é surpreendente. Não tinha uma fita métrica comigo, mas os meus olhos mediram 25 centímetros de folga à frente dos joelhos. Até tracei a perna enquanto escrevia essa nota no meu bloco. E esta nota da perna traçada, também. Na vertical, mesmo com o já mencionado tejadilho em vidro, há espaço suficiente para a cabeça, uns cinco dedos de folga, diria, e o lugar do meio é suficientemente confortável para o amigo mais recente do grupo, até porque, como disse, não há túnel central, claro. Mais atrás, há 432 litros de volume útil, numa bagageira com bons acabamentos, sendo que debaixo do piso há 107 litros adicionais. O rebatimento dos bancos cria um plano de carga horizontal e um espaço com um total de 1555 litros. Há, ainda, um compartimento à frente, ideal para os cabos de carregamento – tomada à frente, também – com 45 litros.
Do lugar do condutor
É aqui que as coisas se começam a complicar para o U5. Os bancos – com regulações eléctricas – são, pelo menos visualmente, impressionantes, mas na prática, não os senti muito confortáveis. O volante quadrado, goste-se ou não do resultado estético, não trabalha bem com as mãos e achei-o, também, demasiado inclinado. E o painel de instrumentos digital, com três secções, embora original, completo e com vários modos de apresentação, tem números e caracteres muito pequenos. Tudo junto, banco, volante e painel de instrumentos, e apesar da boa visibilidade para a frente, não resultou, pelo menos para mim, numa experiência tão confortável quanto gostaria. Relativamente a assistentes de condução, a oferta é extensa, incluindo condução autónoma de nível 2.
O U5 dispensa botão de arranque, sendo apenas necessário rodar o manípulo na consola para a posição D. Fiz-me à estrada e não foram precisos muitos quilómetros para me aperceber de que este primeiro modelo da Aiways é, efectivamente, muito confortável, afinação que, aliada ao muito espaço a bordo, faz do U5 uma excelente proposta para as viagens eléctricas em família. É possível regular a assistência da direcção, bem como a intensidade da regeneração, em três níveis distintos e estão também disponíveis três modos de condução, os habituais “Eco”, “Normal” e “Sport”. É, obviamente, neste último modo que melhor podemos sentir o efeito dos 204 cavalos e dos 310 Nm do motor eléctrico, sendo que a aceleração de 0 a 100 km/h em 7,8 segundos não traduz, da forma mais fiel, a rapidez com que o grande U5 acelera.
Este foi um primeiro contacto curto com o SUV da Aiways e o consumo final pode não traduzir o consumo real de um teste com maior acumulação de quilómetros e num maior número de cenários, mas os 18,5 kWh/100 km de consumo que o painel digital mostrava quando o devolvi ao parque de imprensa, significam que seria possível, em teoria, percorrer cerca de 340 quilómetros com os 63 kWh de capacidade da bateria, um valor inferior aos 400 declarados no ciclo combinado WLTP. Em cidade, a Aiways afirma que o U5 pode, inclusivamente, superar os 500 quilómetros. Embora plenamente orientado, e bem, para o conforto, o U5 mostrou-se ágil e com reacções seguras, transmitindo confiança que complementa a sua indiscutível facilidade de condução. Porém, ainda que bastante confortável, acho que há ainda alguma margem de evolução no refinamento do seu rolar, bem como ao nível da insonorização, facilmente superada pelo ruído de funcionamento do motor eléctrico. Nas acelerações fortes, o “assobio eléctrico” tem a sua graça, quase parecendo uma cena saída dos Jetsons, mas numa longa viagem a história deverá ser bem diferente. O silêncio nos automóveis eléctricos é de tal forma grande que se consegue ouvir tudo, mesmo aquilo que não queríamos. O som do silêncio não é exagerado, mas pode melhorar, acredito.
O primeiro de muitos, muito provavelmente
É importante não avaliar o Aiways apenas com base no facto de ser um automóvel chinês. Não se trata apenas de ser injusto, mas simplesmente não faz qualquer sentido. É um automóvel, um SUV, um eléctrico, como os outros. Não temos que desculpar defeitos, mas, por outro lado, não me parece, também, adequado, neste momento, que o devamos comparar com modelos que temos como referências no segmento ou no mercado, de marcas já consagradas e com uma maior experiência acumulada. Devem, a meu ver, servir como padrão, mas não quero, neste momento, dizer que este U5 é melhor ou pior automóvel que um qualquer seu rival. No entanto, é inevitável fazer esta análise considerando o efeito novidade, de que este é o primeiro automóvel chinês à venda em Portugal. Porque podemos até estar num momento histórico de transição, o destrancar de uma porta que se abrirá totalmente para a expansão europeia da indústria automóvel chinesa.
Assim, as minhas impressões finais deste primeiro teste com o Aiways U5 não são tão boas quanto a impressionante montra tecnológica chinesa deixaria antever, mas também não são tão más quanto os meus padrões europeus poderiam influenciar. São muitos, e desde há muito tempo, os vários exemplos de marcas e modelos automóveis com origem no oriente que são, também desde há muito tempo, extremamente bem vistos na Europa. O Aiways U5 vem de um país que é, para nós, novidade, mas depois de limadas algumas arestas, como a posição de condução, acabamentos no interior, maior dotação de tecnologia palpável e um maior refinamento ao rolar sobre pisos mais degradados, é sem dúvida um produto que pode vir a dar que falar.
O preço desta recheada versão Prime, a única disponível, é de 39.990 euros antes de impostos, estando disponível um desconto de 2.000 euros sobre o preço base para os clientes que optarem pela solução de financiamento.