Os bastidores da criação de um Mazda RX-8 Quad-Rotor para ralis
Decerto se recordará do RX-8 Quad-Rotor 26B a que nos referimos em texto publicado em Junho – pode (re)lê-lo em “Um ‘Tarmac Rocket’ para ralis” – um Mazda que se estreou com enorme estrondo no Targa New Zealand – The Ultimate Road Race, ali alcançando uns quantos resultados de relevo: venceu a Classe, foi 3º no Grupo ‘Allcomers’ e 5ºs da Classificação Geral Final, tendo, pelo caminho, registado vários tempos no top-3 das especiais do icónico rali neo-zelandês, sendo mesmo o mais rápido numa delas!
Apesar de não parecer ser uma viatura nascida para eventos de estrada, os elementos da Klink Rally Sport, uma estrutura composta por familiares, amigos e uns quantos fornecedores de relevo, apostou claramente nele, assente no sucesso de outro RX-8 de três rotores que inscreve nos ralis de terra, num processo que demorou cerca de quinze meses a passar de uma intenção para a realidade.
“Foi um projecto muito desafiante, cujo resultado que se deve a uma incansável equipa a quem não me canso de agradecer, pela dedicação e pelo trabalho, nomeadamente aos mecânicos da Al Marsh Automotive Ltd – Mazda Rotary Specialist, entidade responsável pela construção de um motor que, depois, ao longo do Targa NZ nunca apresentou falhas”, referiu, à Garagem, Marcus Van Klink, o piloto-preparador que, no seu dia-a-dia gere a Universal Plumbing, empresa de canalização bem visível na carroçaria branca do RX-8 Quad-Rotor.
Transmutação: De um comum chassis de estrada a um portento para ralis
Foi no início de 2021 que o RX-8 de ‘Série 2’ vermelho deu entrada na oficina da equipa, em Palmside. Dele pouco restou a não ser o chassis de base, depois de despido e raspado, limpo e preparado, pronto para levar a nova pintura alva, que apenas seria aplicada em Setembro. Seguiram-se as primeiras montagens, das cablagens à bomba de combustível, da caixa Holinger sequencial de seis velocidades, com sistemas flat shift e auto-blip, acoplada ao bloco de quatro rotores 26 B, com admissões AT Power de 54 mm, customizadas, conjunto que estava a cargo da Al Marsh Automotive Ltd – Mazda Rotary Specialist, especialistas da temática que o iam gradualmente aprimorando.
Em Novembro ser-lhe-iam colocadas as ligações à estrada, mais o diferencial (originário de um Dodge Viper), tracção naturalmente às rodas traseiras, a suspensão MCA e o sistema de travagem AP de competição, com seis pinças à frente e quatro atrás. Afinal, havia que reduzir, com bastante eficácia, algumas das ânsias de um bicho que atinge uma expectável velocidade máxima de 220 km/h. O conjunto está dotado de um cluster digital da MoTeC e um sistema da EMTron Computer.
Fruto de um muito aturado trabalho no banco de ensaios e no dinamómetro, este quatro-rotores Wankel de construção caseira acabaria por vir a debitar 640 cv às 9.000 rpm, uma potente alma nipónica que seria depois integrada no chassis e posta a trabalhar, pela primeira vez, a 25 de Fevereiro, ainda com o RX-8 no interior da oficina. Quatro dias depois houve luz verde para umas voltinhas nas imediações da oficina. Com um peso final de 1.370 kg, a relação com a potência deste novo monstrinho para ralis de asfalto atingia uns muito interessantes 2,14 kg/cv!
E o “JAP J3T” sai, finalmente, para a estrada!
Corrigidos os pequenos glitches entretanto identificados, seguiu-se verdadeira estreia fora de casa, no dia 29 de Abril, um primeiro teste realizado em circuito fechado onde um orgulhoso Van Klink se mostrava muito agradado com a máquina que tinha nas mãos, estendendo o reconhecimento do trabalho aos familiares e, claro está, aos sempre indispensáveis patrocinadores, sem os quais um projecto desta dimensão não teria todas as pernas para andar.
“Depois de um par de semanas stressantes e após uns longos meses de trabalho, posso afirmar que o RX-8 Quad-Rotor da Klink Rally Sport ficou fantástico”, acrescentou o piloto neozelandês, ficando o estridente brinquedo de matrícula “JAP J3T” pronto para alinhar à partida do exigente Targa New Zealand – The Ultimate Road Challenge, a sua prova de fogo.
“Os planos iniciais visavam uma participação num Targa mais pequeno, de apenas dois dias, mas as restrições da COVID-19 levaram a que a preparação do carro atrasasse. Não tivemos outra opção do que o levar para um teste de pista e solucionar quaisquer problemas que surgissem. Claro que, com uma viatura deste tipo, houve alguns bastante complicados de resolver, da dificuldade em arrefecer as elevadas temperaturas do óleo, que não esperávamos atingir, até às múltiplas tentativas de fazer com que a ECU se ‘entendesse’ com a unidade de direcção assistida original do RX-8, questões que todos os envolvidos no projecto ajudaram a solucionar.”
Comprado por 3.100 euros para a filha aprender a conduzir
É caso para dizer que valeu o investimento e por larga margem, dos cerca de 5.000 dólares neozelandeses (cerca de 3.100 euros) iniciais da compra do RX-8 original – “são uns carros relativamente baratos na NZ; inicialmente até o comprei para a minha filha aprender a conduzir”, partilhou Van Klink – aos cerca de 300.000 dólares (cerca de 182.000 euros) que, entretanto, já foram injectados no seu dossier. A título de comparação, para o RX-8 Tri-Rotor usado nos ralis de terra a equipa já investiu, até à data, cerca de 210.000 dólares locais (127.000 euros).
Quanto a potencial de desenvolvimento, “estamos a analisar todos os dados que recolhemos desta primeira saída do Quad-Rotor, desenvolvendo-o a partir daí. Vamos melhorar o controlo do acelerador por via da ECU e, talvez, apostar em pneus maiores”, confidenciou Van Klink.
Com estes e outros tweaks a aplicar a este inédito Mazda RX-8 Quad-Rotor 26B, vamos ter, decerto, um novo foguete a dar cartas nos ralis de asfalto. Volto a frisar: pena é que a Nova Zelândia fique tão longe…!
Fotos: Oficiais / Van Klink Sport (Facebook)