Três peças de joalheria em competição no Estoril Classics 2022
De entre as jóias de colecção que teimam em manter-se vivas nas corridas, destacamos três exemplares do passado que nos continuam a maravilhar no presente: um Ferrari e um Jaguar, que, pela sua idade e pelo seu valor de mercado, poderiam estar numa qualquer protecção blindada transparente e não em corridas de automóveis, mais um curioso Porsche, símbolo do desejo e vontade de chegar mais além, objectivos alcançados a 100%!
De entre as centenas de viaturas que a Peter Auto e a Race Ready reuniram no Estoril, no início de Outubro, no âmbito do Estoril Classics 2022, contavam-se alguns automóveis menos conhecidos e outros que, pela sua riquíssima história, de produto ou de motorsport, não passaram despercebidos aos olhos de quem os viu. No paddock ou em pista, todos se entregaram a diferentes mano-a-mano, fosse a discutir as melhores posições dentro das suas categorias ou, muito simplesmente, só a desfilar frente ao muito público que, então, encheu as diferentes bancadas do autódromo.
Dentro da tão ampla escolha passível de ser feita, elegemos três exemplares de elevado pedigree associado: um Ferrari e um Jaguar, de há múltiplas décadas, duas peças com valores de mercado quase estratosféricos, mas que os seus donos fazem questão de levar para os circuitos mundiais – e ainda bem, para que os possamos ver e sobre eles escrever na Garagem – juntando-lhes um certo Porsche, produzido em restritíssimo número de exemplares, com o objectivo último de vencer a Targa Florio e em Nürburgring.
Jaguar D-Type e Ferrari 250 GT SWB, os mais valiosos do paddock
Integrados no grupo The Greatest’s Trophy, rodaram pelo Estoril dois autênticos monumentos que se destacaram das demais pérolas que encheram a respectiva lista de inscritos: um Jaguar D-Type (#29) de 1955 e um Ferrari 250 GT SWB (#20) de 1962. São dois automóveis que fizeram furor nas corridas de endurance dos anos ‘50 de Daytona a Le Mans e que no Estoril somavam múltiplos zeros em termos de valorização no mercado dos coleccionadores. Falou-se em duas dezenas de milhões de euros no primeiro caso e uma dezena no segundo!
Depois de na época de competições agora finda se terem defrontado por outras paragens, em que as iniciativas da Peter Auto montaram os seus hiper-recheados arraiais, os adversários que alimentaram múltiplas batalhas entre britânicos e italianos voltaram a reencontrar-se no nosso circuito à beira da capital, integrados num grupo que continha outras propostas igualmente icónicas, dos Alfa Romeo Giulietta SZ e Giulia TZ, aos inesquecíveis Porsche 904/6 Carrera GTS, ambos de 1964, sem abdicar dos imponentes Bizzarini 5300 GT, exemplares do ano seguinte. Um lote em que o mais antigo era um Fraser Nash Targa Florio, de 1952.
Começando pelo Cavallino, da versão Berlinetta apenas se construíram 166 exemplares, de 1959 a 1962, 74 dos quais na versão “Competizione”, com chassis em alumínio (os restantes 92, de estrada, tinham chassis em aço), com um motor Columbo 3.0 V12. Já a referência “SWB” representa “Short Wheel Base” ou “Passo Corto”, em italiano. Ainda mais raros – terão sido feitos apenas 75 exemplares entre 1954 e 1957 – são os D-Type, viatura que a Jaguar desenvolveu especificamente tendo em mente a vitória em Le Mans, aqui apostando-se num bloco de seis cilindros em linha XK.
Não surpreende, por isso, que os poucos exemplares de ambos que, pontualmente, aparecem nos grandes leilões internacionais atinjam valores estupidificantes. Os mais caros dos Berlinetta SWB que têm andado nessas andanças rondam algo na casa dos 10 milhões de dólares norte-americanos, menos de metade dos 21.780.000 que em 2016 um D-Type registou num leilão da RM Sotheby’s.
Em termos de resultados no Estoril, o Ferrari branco de Christian Dumoulin impôs-se ao Jaguar preto de Pierre-Antoine de Selancy e Jean-Marc Fusil em ambos os confrontos, tendo a máquina italiana garantido um 8º e um 7º lugares nas duas corridas, sempre uma posição acima da dos seus adversários. Mas mais do que os resultados, era vê-los reluzentes – e a fazer ecoar as suas mecânicas – no respectivo paddock, em que as simples tendas de tela e alumínio montada atrás das boxes não faziam, de todo, jus à sua merecida imponência!
908/03, o levezinho da Porsche que batia pesos-pesados
Noutro domínio, entre os concorrentes à categoria Classic Endurance Racing, houve um modelo de competição que teve o mais que esperado impacto entre os fãs da modalidade, o Porsche 908/03, viatura que no Estoril Classics esteve representado com duas unidades. Qualquer uma delas apareceu com as icónicas cores que marcaram as participações oficiais da marca de Zuffenhausen nos grandes circuitos internacionais: um vestido de Gulf e outro de Martini, este um exemplar que, em tempos, teve ao seu volante o mundialmente conhecido Dr. Helmut Marko, hoje consultor na estrutura da Red Bull Racing na F1.
Produzido no início dos anos ‘70, apenas se conhecem pouquíssimas unidades do 908/03 Spyder – fala-se em apenas 2 verdadeiros chassis, do total de 13 que ao longo dos tempos foram adaptados do original 908 e, depois, do 908/02 – um levezinho do tipo open cockpit de muito curta distância entre eixos. Com apenas 500 kg de peso, conta com bloco Flat 8 arrefecido a ar de 3,0 litros, com 370 cv às 8.400 rpm e uma velocidade máxima de 290 km/h. As semelhanças em termos de carroçaria eram quase nulas entre as unidades iniciais e as finais, já dotadas de duas barbatanas verticais na traseira, um roll-bar mais volumoso e pneus de maiores dimensões, características de ambos os exemplares que rodaram no Estoril.
O 903/3 nasceria com o propósito único de vencer a mítica Targa Florio e os 1.000 km de Nürburgring de 1970, algo que conseguiu de imediato, alcançando uma dobradinha em ambos, batendo carros bem maiores e mais potentes, evidenciando as suas diminutas características. No ano seguinte e entre outros resultados, já com as tais barbatanas verticais na traseira, garantia uma tripla nesse traçado alemão. Os sucessos da geração 908 teriam continuidade ao longo de mais uma década, nomeadamente com equipas privadas, registando-se a sua última vitória oficial na edição de 1980, de novo na pista dos arredores de Nürburg.
Infelizmente o 908 nunca conseguiu uma vitória em Le Mans – aqui a Porsche continuava a vencer, mas com os 917K – tendo como melhores resultados dois terceiros lugares à geral, em 1970 e 1972, contribuindo para os títulos consecutivos da marca nos campeonatos de resistência.
Aqui no Estoril também não houve vitórias após os confrontos com as demais viaturas da categoria Classic Endurance Racing I. O melhor resultado foi um 5º lugar para o 908/3 #114, de 1970, da dupla Henrique Gemperle / Marc de Siebenthal, , enquanto o solitário Peter Vögele, no 908/3 #48 (1969) saiu do Estoril com um esforçado 13º posto.
Fotos: Garagem/Jota Pê; Rui Reis Fotos; Peter Auto; Race Ready