Ensaio Total: Ford Bronco Outer Banks
Se recuarmos um pouco no tempo, antes do fenómeno SUV se ter imposto nos segmentos mais relevantes do mercado europeu, um automóvel com as capacidades para o fora de estrada como este regressado Bronco jamais teria essa designação. Era, simplesmente, um todo-o-terreno, quais SUV, quais quê. A não ser que fosse originário do lado de lá do Atlântico, gigante mercado onde o nome Sports Utility Vehicle sempre foi mais comum, sendo exatamente esse o caso deste novo e muito bem-vindo modelo de nome icónico.
Por este duplo motivo, por ter “nascido” em Dearborn, no estado do Michigan, Estados Unidos da América – como a sua cédula cravada na consola o comprova – e por ser um “todo-o-terreno atual”, o novo Ford Bronco é um verdadeiro SUV, mas um que oferece verdadeiras capacidades para deixar o alcatrão para trás e partir à aventura, argumentos que, no nosso mercado e neste segmento, são pouco os modelos capazes de propor robustez e competência à altura.
É impossível não abordar o design, propositado, assertivo, à prova de tudo. Parece linguagem de marketeer, mas admitam lá que não é verdade? Uma excelente interpretação moderna das linhas do Bronco clássico, fiel aos seus valores originais, mas onde não faltam elementos e tecnologia com os quais o original de 1966 nem sequer sonhava. São disso bons exemplos as jantes de 18 polegadas e a iluminação LED, à frente e atrás.
À prova de tudo, também no interior
O habitáculo transmite a mesma sensação de resistência e aptidão, contando, na sua maioria, com superfícies rijas, mas, acima de tudo, fáceis de limpar quando tudo estiver cheio de pó. Sim, porque é possível remover o tejadilho e partir para uma poeirenta aventura a céu aberto. Os botões no volante, por exemplo, são forrados a borracha, protegendo-os da entrada de água, e as robustas pegas de apoio nas laterais do tablier e na consola são bem-vindas para subir a bordo e para quando o percurso se tornar mais acidentado.
O tablier tem um design muito vertical, quase alinhado com o pequeno para-brisas, e recebe ao centro o grande ecrã do infotainment, fácil de usar, diga-se. Abaixo do display tátil, num perfeito de exemplo de design prático, funcional e descomplicado, uma consola com verdadeiros botões para controlo das funções multimédia e da climatização. O painel de instrumentos é híbrido, combinando um velocímetro analógico com informação digital, incluindo dados muito úteis sobre a distribuição de potência pelos eixos e os ângulos de todo-o-terreno.
Atrás, apesar do banco não ser especialmente cómodo, não falta espaço para as pernas e cabeça e viaja-se em posição relativamente alta. O pequeno túnel central não chega para incomodar, mas o lugar do meio não é confortável. As portas pequenas não são ideais em termos de acessibilidade, mas o facto de abrirem a quase 90 graus compensam a sua pequena dimensão. No que à versatilidade diz respeito, o rebatimento do encosto permite criar um plano de carga sem degraus, elevando a capacidade da bagageira – de formas muito regulares – dos cerca de 500 litros para praticamente 1.800 litros. A bagageira conta ainda com uma plataforma extensível que serve de bancada ou de banco. Perfeito para uns dias de acampamento selvagem, até porque um dos extras propostos é uma tenda de campismo.
Bronco, mas rápido
O Bronco é proposto em Portugal com uma única motorização, um cremoso e possante V6 Ecoboost com 2.7 litros de cilindrada, a gasolina. Com 335 cavalos e 563 Nm de binário, não são os quase 2.300 kg do Bronco que o assustam. Bem explorado pelas 10 velocidades da caixa automática, o muito pulmão da mecânica começa a revelar-se logo a partir dos baixos regimes, ao mínimo toque no acelerador. O Bronco consegue até acelerar de 0 a 100 km/h em menos de 7 segundos, mantendo, ao mesmo tempo, uma sonoridade contida e refinada, típica de um nobre, mas musculado, motor V6. A eficiência não é, claramente, o seu forte, mas cheguei a concluir alguns percursos com médias de consumo em redor dos 11 l/100 km, nada chocante considerando aquilo que o Bronco representa em termos de automóvel. Obviamente que, considerando uma utilização mais abrangente, com alguns passeios e desafios de todo-o-terreno à mistura, a média será sempre superior. Neste ensaio, devolvi o Bronco à Ford com o computador de bordo a mostrar um consumo final de 14 l/100 km.
No alcatrão, apesar da sua imponente dimensão – é necessário ter atenção ao tamanho dos retrovisores nas vias mais estreitas ou congestionadas – o Bronco conduz-se com muita facilidade. As suas formas regulares, a posição de condução elevada e um motor sempre “cheio” garantem que não é nada difícil progredir em conforto, sensação explicada pela muita capacidade de filtragem da suspensão, mas também pelo perfil elevado da borracha Bridgestone Dueler A/T de medida 255/70, o qual contribui com uma primeira camada de amortecimento que é muito bem-vinda sobre asfalto mais rugoso ou maltratado. Já o isolamento acústico não é um dos seus pontos fortes. A aerodinâmica pouco “simpática”, os pneus com rasto exigente e as janelas sem moldura e painéis amovíveis do teto não ajudam.
GOAT Modes: para rolar sobre qualquer piso
Deixando o alcatrão para trás, o Bronco está mais do que apto a adaptar-se aos vários tipos de piso que lhe possamos colocar à frente. Através do comando rotativo na consola central, temos acesso aos GOAT Modes, os habituais modos para condução normal, ecológica ou desportiva, mas também aos específicos para fora de estrada, nomeadamente: Escorregadio, Lama/Terra e Areia. Ao centro do comando, podemos selecionar a tração às quatro rodas, as redutoras e ainda um modo específico para trilhos.
Apontei o Bronco a uma subida íngreme, em terra batida, e selecionei o modo Lama/Terra, bem como a tração integral com redutoras. Mas fi-lo só para aumentar a eficácia com que sabia que o Bronco ia enfrentar o obstáculo, um desafio que era claramente de maior respeito para o condutor, pouco habituado a estas andanças, do que para a máquina. Como previsto, pude até dar-me ao luxo de parar a meio da subida, bastando tirar o pé do travão para sentir de imediato a força do motor V6 a fazer o Bronco trepar a encosta sem quase se ouvir quaisquer sinais de perdas de motricidade pontuais das rodas. Senti que fui pouco exigente, mas quis, acima de tudo, não arriscar e devolver, assim, o bonito Outer Banks sem riscos.
Chamem-lhe o que quiserem. Um veículo desnecessário, exageradamente grande e excessivamente gastador, mas o novo Bronco é um genuíno sucessor do Bronco original, com um design moderno que respeita a personalidade do clássico e, ao contrário de muitos outros SUV que por aí andam, é um veículo com um propósito e com verdadeiras capacidades para o todo-o-terreno. Não lhe falta um modo que permite bloquear a roda traseira interior para permitir reduzir o raio de viragem, quase o fazendo rodar sobre si próprio. Genial. Obviamente que não é um automóvel para todos os dias e muito menos para todas as ocasiões, custando em Portugal a módica quantia de 117 mil euros (sem despesas e opcionais), mas não há como negar as capacidades, o carácter e, num mercado onde os rivais se contam pelos dedos de uma mão, a singularidade do Bronco.