Alfa Romeo Giulia Quadrifoglio
Ti amo Giulia
Recentes ou antigos, da minha garagem de sonho fazem parte automóveis que muitos outros petrolheads admiram mas também outros que, uma percentagem ainda maior de fãs de carros, não perceberá o que neles vejo. Aprecio, até certo ponto, um concept invulgar, aquele desportivo esquecido ou até mesmo o humilde utilitário, principalmente aqueles com que cresci, mas como todas as pessoas que vivem intensa e constantemente o mundo automóvel, tenho as minhas marcas de eleição e, em especial, aqueles modelos ou versões a cujos números, que nem de perto quantificam o nível de performance oferecida, não é possível ficar indiferente. Dito isto, digo isto: gosto muito da Alfa Romeo e gosto muito do Giulia. No fundo, o que importa reter é esta ideia. Porém, há muito para dizer sobre este Giulia Vermelho Competizione em particular, um super especial Quadrifoglio. Os anos passam e a minha garagem de sonho não pára de aumentar. Felizmente, nos sonhos as garagens são ilimitadas e alguns deles, também para nossa felicidade, de uma forma ou de outra, concretizam-se. Foi este o caso. A minha estreia com a marca italiana deu-se logo com o Quadrifoglio. E vermelho! Um carro que, assim que foi anunciado, teve entrada directa para os meus preferidos de sempre. É-me impossível resistir à combinação de elegância e agressividade das linhas da carroçaria, aos números que esconde dentro do V6, debaixo do longo capot em carbono e, principalmente, à história que herdou e que carrega no símbolo que orgulhosamente expõe acima da sua grelha.
Tenho tido o prazer de conduzir inúmeros automóveis novos, potentes e apaixonantes, mas poucos ou até mesmo nenhum outro me fez sentir o que este fez. E isto ainda antes de lhe por as mãos em cima. Do momento em que desliguei a chamada de confirmação do ensaio até àquele em que finalmente acordei os 510 cavalos, foram muitas as horas a pensar no dia que nunca mais chegava. Nas fotografias que queria fazer. Nas palavras que queria usar. A verdade é que, agora que já não o tenho comigo, tudo o que fiz comparativamente a tudo o que este automóvel merece, parece pouco. Tudo parece insuficiente para mostrar a qualidade do detalhe. Tudo o que eu poderia ter feito não lhe faria justiça. Só essa ideia me acalma. O Giulia Quadrifoglio é para pessoas como eu, ao mesmo tempo, uma obra de arte, uma máquina de emoções, um objecto de desejo. São poucos, pouquíssimos mesmo, os carros que me fazem sentir isto.
Chegado o dia, e já dentro das instalações da Alfa Romeo e de chave na mão, caminho pelo parque até ao Quadrifoglio e não consigo conter o entusiasmo quando, ao dobrar a esquina de um edifício, identifico de imediato a sua frente. Lindíssima como as dos restantes Giulia que lhe faziam companhia, mas claramente mais agressiva, mais focada. Não era a primeira vez que me cruzava com ele, só que desta vez ele vinha comigo para casa. Já no habitáculo, bem encaixado no banco, chega a altura de sentir pela primeira vez a emoção de carregar no botão que dá vida ao motor (verdade seja dita, nas seguintes, a emoção não foi menor…). O V6 acorda rouco, com um som que não deixa ninguém indiferente. O velocímetro escalado até aos 330 km/h está lá, também.
Feitas as primeiras apresentações e já mais ambientado às respostas da direcção, travões e para aí a uns 20% da capacidade de aceleração do Quadrifoglio, defini o meu GPS interno para a Serra de Sintra. Inevitável. Sem acesso a um autódromo ou, por que não, um aeródromo onde espremer os mais de 500 cavalos, o tapete negro que finta a densa floresta de Sintra pareceu-me o cenário ideal, com a dose certa de romantismo para conhecer o lado mais emocional deste Giulia. Ali, a humidade matinal é uma constante mas felizmente o alcatrão estava já a começar a secar dando-me mais confiança para explorar um pouco mais as capacidades deste tão especial Alfa. Entre curvas que me são relativamente familiares, não tenho memória de um outro carro que as tenha aproximado em tão escassos segundos. A capacidade de travagem é avassaladora, mas ainda mais impressionante é a confiança transmitida pelo pedal que teima em não dar sinais de fadiga por muito que o castiguemos. Nestes momentos, em que a transferência de massas poderia desequilibrar o eixo dianteiro na abordagem à curva, entra em cena o amortecimento activo do chassis que evita os movimentos excessivos da carroçaria, bem como uma distribuição de peso ideal, garantindo uma eficácia assombrosa nas viragens e nas mudanças repentinas de direcção, com o Giulia Quadrifoglio a responder com acutilância e a curvar certinho, sempre paralelo ao asfalto. A direção é rápida. Mesmo muito rápida, atenção. Tão rápida que mesmo em curvas mais fechadas o ângulo de volante necessário para a fazer não exige que se tirem ambas as mãos do volante. À saída e em aceleração forte, a excelente capacidade de tracção é assegurada pelos enormes Pirelli e pelo diferencial com vectorização de binário, que pode também dispor de autoblocante. As ligeiras derivas do eixo traseiro são um hino ao prazer de condução assim como o são os mais longos drifts, mantendo o Giulia atravessado enquanto não se acabar a borracha dos pneus ou o talento do condutor. Simplesmente viciante.
Devolver o Giulia foi doloroso. O som das portas ao trancá-lo pela última vez ainda hoje me atormenta. Tenho saudades do som do motor, dos tiros do escape, da fúria dos 510 cavalos e da beleza do seu corpo de quatro portas. Saudades de sentir o empurrão que me fazia desaparecer no banco e da força de travagem igualmente impressionante quando pisava o pedal ao lado. Saudades de ter a chave no bolso. Saudades de poder dizer, embora não fosse meu: “Hoje estou de Alfa.” Queria poder virar-lhe as costas como fiz no último dia de ensaio, na escuridão do parque da estacionamento da Alfa Romeo onde o deixei, afastando-me pelo caminho que ele próprio iluminou, sabendo que no dia seguinte ele estaria de novo ali para mim. Não sei se estou agora mais perto de poder ter um só meu, mas de uma coisa tenho a certeza: quero-o hoje mais do que ontem e um bocado menos do que amanhã. Já longe, vi a minha sombra desaparecer, quando ao adormecer o Giulia apagou as luzes.
Agradecimentos: FCA Portugal – Alfa Romeo
Fotografia: Pedro Francisco