Caterham 275
The Magnificent! Seven! À memória de Colin Chapman
Made in Great Britain since 1957
A Garagem é um meio digital. Escrevo, fotografo, edito e publico no digital. Não prescindo do meu smartphone nem do meu tablet para acompanhar a actualidade global, em especial os automóveis de que tanto gosto. Por outro lado, não quero deixar de comprar as minhas revistas de eleição da especialidade. Não me vejo, no futuro, a deixar de o fazer. Não quero, também, soar demasiado antiquado do alto dos meus ainda jovens 30 e picos anos, mas se há coisa de que não prescindo mesmo é de um bloco e de uma caneta. Gosto de escrever mas também do acto da escrita. Como tal, poder ensaiar um automóvel desportivo britânico nascido nas e para as pistas e criado por um dos maiores génios da engenharia de sempre, tendo a liberdade para escrever umas quantas linhas sobre tão icónico automóvel no meu caderno, revisitando as suas origens e a sua história de 60 anos, é um verdadeiro privilégio. Dono de uma agilidade ímpar, sem ajudas à condução, tudo pelo prazer de condução orgânico que tanto valorizamos. Caros amigos, este é o Caterham 7.
“Simplify, then add lightness”, Colin Chapman
Comecemos pela definição de relação peso/potência, o conceito mais importante para se entender a filosofia e a designação dos Caterham 7. Dividindo o peso pela potência do motor, ficamos com uma ideia de quantos quilos tem cada cavalo do motor à sua responsabilidade. E para facilitar as coisas, a Caterham designa as versões do Seven com base nesse conceito, mas em potência por tonelada. E uma tonelada é um peso que o Caterham Seven não tem, independentemente da versão. Longe disso. É essa a razão pela qual esta versão se chama 275, 275 cavalos por tonelada. E se o motor que o equipa debita “só” 135 cavalos, façam as contas ao peso total deste fórmula. Perdão, automóvel. São cerca de 500 kg. Menos de metade do peso de um automóvel comum. Esta era a maneira de pensar do Pai do Seven original, uma das mentes mais brilhantes do mundo automóvel, Colin Chapman, fundador da Lotus. O segredo estava na leveza de construção. Os feitos do inglês marcaram a história automóvel e continuam a inspirar, ainda hoje, os milhares de fãs que vibravam à passagem dos seus carros nos principais circuitos mundiais. Exemplos disso são o Lotus 49, no qual se inspira a pintura do Caterham em ensaio, pilotado pelo versátil Jim Clark, bem como o lindíssimo Lotus 78, com a fabulosa pintura da John Player Special conduzido pelo Super Swede, Ronnie Peterson. Ambos impulsionados pelo mítico motor Ford-Cosworth DFV. Chapman e os seus automóveis são um só. Lendários.
“Strap in, take a deep breath and prepare yourself. You’re about to have the ride of your life” – Caterham
Voltando ao Caterham 275, antes de iniciar este ensaio pus de parte tudo aquilo a que me tenho vindo a habituar ao ter contacto com os mais recentes automóveis. Sim, tudo neste ensaio ia ser diferente, uma verdadeira viagem ao passado. Uma experiência, logo à partida, memorável. Primeira fase, entrar no Seven. Entrar, que é como quem diz deixar-me cair dentro do apertado cubículo. Primeiro o pé direito, depois as mãos, uma junto do travão de mão, a outra onde normalmente está uma porta. Finalmente, escorrego no banco até me encaixar junto do pequeno volante da Momo, essencial para o aspecto cru e racing do posto de condução do Caterham. Rodo a chave, pressiono o botão de arranque e o motor Ford 1,6 lt ecoa ruidosamente no bonito espaço da Caterham Cars Portugal, em Lisboa.
Com a primeira fase completada, procuro, de imediato, a saída mais rápida do centro de Lisboa, não sem antes fazer parar o trânsito (ainda mais) em plena Praça de Espanha. Aqui, enquanto aguardava pelo verde do semáforo, começaram a surgir os primeiros cumprimentos, as perguntas sobre o Seven e, obviamente, os incentivos à rebeldia. Acelerar um pouco para se ouvir o motor, puxar uma segunda e fazer uns piões foram os “discos” mais pedidos. Dei muitas negas, mas aos adeptos mais fervorosos, muitos deles crianças, que só queriam ouvir o “carro de corrida” um pouco melhor, não consegui dizer que não, provocando um ou outro estouro do barulhento escape lateral do Seven. Teve que ser. Nos restantes dias sou eu quem está do outro lado da barreira. Sou eu a criança no passeio ou o fã dentro do utilitário e sei o quão bem me sabe aquele momento. Eu compreendo-vos e sou solidário convosco.
“Driving doesn’t have to be a fight. It’s just more fun sometimes if you get in the ring” – Caterham
Já fora de Lisboa, dirigi-me de imediato a um local mais apropriado às suas capacidades e onde pudesse explorar melhor tudo aquilo que o Seven tem para oferecer. Começando pelo motor, o que há a dizer é que a gama Seven começa com um pequeno motor com 660 cm3 de cilindrada, passa pelo 1,6 lt do nosso ensaio e termina nas versões mais picantes equipadas com o motor 2,0 lt. Associado aos vários níveis de potência, destaco um facto interessante que a Caterham usou no catálogo do Seven, o grafismo que quantifica a performance de cada versão. Este 275 está a 50%, um valor que me custa a aceitar depois de ter carregado a fundo no acelerador. Os 5 segundos que passam desde o arranque até aos 100 km/h colam-nos constantemente ao banco e a brutalidade com que somos tratados em plena aceleração é simplesmente indescritível. O curso da embraiagem e da caixa de velocidades é extremamente reduzido e permite realizar passagens muito rápidas, uma vez que a precisão com que o manípulo se move é também ela digna de registo. Movimentos que se querem decididos e que são muito gratificantes graças ao feeling mecânico da caixa. Após os breves momentos em que interrompemos a aceleração para passar à relação de caixa seguinte, a rapidez louca com que os ponteiros se mexem é retomada e a experiência continua até se atingirem as 6800 rpm. O coice (sim, é a melhor palavra) após largar a embraiagem é verdadeiramente impressionante.
“Adding power makes you faster on the straights. Subtracting weight makes you faster everywhere”, Colin Chapman
A pureza de sensações continua graças aos travões e à direcção não assistidos. Tudo em nome da leveza e do prazer de condução. E se os travões assustam nos primeiros quilómetros devido à força necessária para pisar o pedal do meio, diga-se que a capacidade está lá toda. Relativamente à direcção, muito directa e informativa, comunica-nos através do pequeno volante o que se passa lá à frente. E o melhor de tudo é que conseguimos apontar o Seven com precisão para a entrada das curvas, devido à carroçaria tipo fórmula que permite ver as rodas da frente a responderem aos inputs que lhes fazemos chegar. O nosso cérebro parece ligado directamente ao eixo dianteiro pela forma como este aponta o nariz amarelo do Seven às curvas que rapidamente surgem. Simplesmente único! Sobre o comportamento, todas as palavras parecerão escassas perante a tão aplaudida dinâmica de um automóvel com este pedigree. Adornar de carroçaria e reacções lentas é vocabulário que o Caterham Seven desconhece, devorando as curvas com indiferença e uma precisão quase cirúrgica. Também aqui, nas capacidades dinâmicas providenciadas pela direcção e suspensão se notam os benefícios do peso contido do Seven.
“At Caterham, we hold with the theory that less is more” – Caterham
O habitáculo tem apenas o essencial para a condução deste tão especial desportivo britânico. Um volante, três pedais e uma caixa de velocidades à antiga permitem-nos explorar todo o potencial do motor atmosférico de origem Ford. Este nunca passa despercebido, quer pelo rouco som de admissão, quer pelo grito do escape mesmo quando não estamos a “pisar o risco”. São estes os responsáveis pelos intermináveis sorrisos, pelos momentos pejados de adrenalina, pelo divertimento e prazer de condução que está na base do projecto e da construção deste histórico automóvel, nascido do talento e engenho de Chapman e que ainda hoje, 60 anos depois, vive e prospera num mundo automobilístico onde são cada vez mais raros os modelos puramente analógicos. O Caterham Seven existe para quem gosta de conduzir, sentir as reacções naturais de um automóvel ao mesmo tempo que desenvolve as suas capacidades enquanto entusiasta do desporto motorizado, do actual e do de outrora. Os valores do Lotus Seven estão lá todos e o espírito de Chapman está vivo. Magnífico, Caterham. Top job, lads.
Fotografia: Garagem/Tiago Costa