Cupra Born: Nada será como dantes, mas começo a ter alguma esperança
Dizer que tinha expectativas elevadas para este automóvel, é dizer pouco. Sou um fã assumido da marca Cupra, já o era ainda antes desta se ter tornado uma marca praticamente independente da SEAT, nos tempos em que essa era a designação dos modelos mais focados na performance. Cresci a admirá-los e como entusiasta de automóveis desportivos, em particular, com motores de combustão, estava mais do que curioso com a chegada ao mercado do primeiro eléctrico da Cupra. Não vou, no entanto, dizer que o Born podia ser melhor e mais emocional se não fosse eléctrico. Nada disso. Vou tentar descrevê-lo, às suas características e às sensações da sua condução, enquanto um Cupra movido a electrões.
Um ID.3 Cupralizado
Visualmente, acho que foi feito um excelente trabalho. Assente sobre a plataforma MEB do grupo, o Born partilha inúmeros componentes com modelos como o Volkswagen ID.3 e até na sua carroçaria isso é facilmente perceptível. As linhas gerais deste Cupra e elementos como as portas são em tudo idênticas, mas o Born dá bastante mais nas vistas, prescindindo de uma grande parte da abordagem minimalista do primo alemão e optando, pelo menos nesta bonita unidade que conduzi, por mais elementos distintivos e contrastantes, como as jantes de 20 polegadas com apontamentos no tom cobre tão característico da marca. A dianteira é, parece-me óbvio, a área em que o Born mais se destaca relativamente ao ID.3, revelando muito mais identidade.
O habitáculo do Born é, igualmente, um sítio mais especial para se estar do que a bordo do Volkswagen ID.3 e, uma vez mais, a “culpa” é dos elementos desportivos que adicionam mais distinção e emoção a um design que é, para alguns, demasiado distante e, de novo, minimalista. Os bancos são muito bons, de aspecto assumidamente desportivo, em tecido Dinamica, e custam cerca de 1800 €. Pois. O infotainment conta com um ecrã de grandes dimensões, bem como com um excelente grafismo, mas, uma vez mais, por acumular praticamente todas as funcionalidades disponíveis, torna a experiência de utilização menos agradável e propícia a momentos de distracção ao volante. O painel de instrumentos digital pode até ser pequeno, mas a sua posição, solidária com a coluna de direcção, é garantia de facilidade de leitura das informações.
Boa apresentação e habitabilidade
A escolha de materiais combina alguns de elevada qualidade, como no tablier, agradáveis ao toque, com outros menos nobres, como por exemplo nas portas. Mas isso está longe de ser um problema ou algo que mereça ser revisto. O mesmo não pode ser dito do comando dos vidros na porta do condutor, em que o grupo optou por poupar em dois interruptores, adicionando um botão táctil “Rear” que permite alternar entre o controlo dos vidros dianteiros e traseiros. Neste patamar de preço, parece-me uma opção algo deslocada e a verdade é que foram várias as vezes em que accionei o botão “Rear” sem querer, tantas como aquelas em que este demorou a responder quando quis, efectivamente, activar a função. Um botão que se devia chamar “Rever”.
O espaço a bordo, considerando as suas dimensões exteriores, deixou-me bastante agradado. Não havendo veio de transmissão, não há qualquer intrusão ao centro e por isso, no banco de trás, o lugar central revelou-se até bastante utilizável. É certo que o espaço disponível em largura para três passageiros vai limitar um pouco o conforto, mas gostei da sensação. Nos lugares laterais traseiros, e considerando a minha posição de condução, estes podem contar com bastante folga para os joelhos e espaço apenas suficiente para a cabeça, uma vez que este “AL01OV” do parque de imprensa da Cupra estava equipado com tejadilho panorâmico em vidro. Já a bagageira dispõe de 385 litros de capacidade.
Não é o mais fraco, é o menos potente
Embora esteja disponível uma versão mais orientada para a performance, com 231 cavalos e com duas capacidades de bateria disponíveis, de 58 ou 77 kWh, este bonito Born – em Azul Aurora e com jantes de 20 polegadas, uma combinação com um custo “arredondado” de 2400 € – dispõe de um motor de 204 cavalos e da bateria de 58 kWh, sendo por isso a versão mais dócil, chamemos-lhe assim, da gama. Ainda assim, e não esquecendo os cerca de 1850 kg que pesa, não se pense que não é merecedor de pertencer à família Cupra. A velocidade máxima pode ser apenas 160 km/h e mesmo a aceleração de 0 a 100 km/h em 7,3 segundos não vai certamente impressionar os condutores habituados a performance elevada, mas o Born é um dos raros veículos elétricos que, à sua curiosa e silenciosa maneira, consegue proporcionar algumas emoções fortes a quem vai ao volante.
Sim, a tracção é traseira, mas escusam de pensar em longas atravessadelas e em rotundas feitas com o volante quase trancado na direcção oposta, pois a electrónica, mesmo se convidada a sair, acaba sempre por revelar-se. Ainda assim, o Cupra Born é um dos eléctricos que melhor esconde o seu peso na altura de fazer curvas depressa. A direcção é precisa e rápida, mas sem o ser em demasia, dando confiança e minimizando o que rapidamente se podia transformar num excessivo nervosismo do eixo dianteiro.
Pesado, mas ligeiro
Digo isto porque se este responde com eficácia e muita aderência sob aceleração nas curvas lentas, com o motor eléctrico a empurrar e a quase forçar o Born a rodar sobre si próprio numa muito discreta e facilitadora sobreviragem, as rodas da frente podem também revelar alguma tendência a alargar ligeiramente a trajectória, principalmente nas curvas médias em que o poder de aceleração é ainda bastante convincente. Senti-o, uma ou outra vez, mas em defesa do Born, não só o asfalto deixava muito a desejar em termos de atrito, como os seus pneus têm claramente outras prioridades.
Mesmo sem o controlo dinâmico de chassis instalado – Pack Dynamic por 895 € – não só o comportamento me deixou convencido, como em momento algum o Born me pareceu consegui-lo à custa de uma excessiva rigidez de suspensão, algo que, em tantos eléctricos, salta imediatamente à vista, precisamente pelo rolamento algo saltitão. Um bom controlo de movimentos que proporciona dinamismo à condução, mantendo, igualmente, um bom nível de conforto. Gostava, porém, de voltar a pôr as mãos num Cupra Born com amortecimento variável instalado e assim perceber quão notórios são os benefícios.
Com mais calma
Acalmando-se o ritmo elevado para o qual o Born foi claramente pensado, consegui registar uma média de consumo combinado de 15,5 kWh/100 km, o que, em teoria, coloca a autonomia bem acima dos 401 quilómetros declarados pela Cupra. Tive, igualmente, oportunidade de testar o carregamento rápido através de um posto de 50 kW de potência. Em 31 minutos, e após “abastecidos” 25,11 kWh de “combustível”, a autonomia subiu de 118 para 287 quilómetros. Resta saber, porém, em que custo se traduziu este carregamento, algo a que ainda não tenho acesso. E já que estamos a falar de “euros”, o preço base deste Born é 41.424 €, mas considerando todos os opcionais, como a pintura, jantes, tejadilho em vidro, o abrangente pack de assistentes de condução, entre outros, o preço dispara para os 49.070 €. Um preço elevado, em linha com a exclusividade da marca, diga-se.
Azul Aurora, a cor da esperança
Não vou, nem quero, como disse, comparar este automóvel de veia desportiva com um equivalente, em potência e capacidades, com motor a gasolina. Até porque não acho que seja esse o objectivo deste Born. Vejo-o mais como um eléctrico com argumentos dinâmicos acima da média, com imagem, detalhes e equipamento que lhe adicionam a tal exclusividade, mas sem querer substituir, por exemplo, um Cupra Ibiza ou Leon. É um eléctrico, rápido e ágil, da Cupra. Só isso.
Porém, graças a automóveis como o Born, começo a ter alguma esperança para o silencioso e até, por vezes, algo “frio” futuro do mundo automóvel em que me imagino, desprovido de emoção ao volante, pelo menos daquela a que estou habituado. Se o futuro tem de ser eléctrico, que ao menos seja, até certo ponto, electrizante e emocionante. Na medida do possível, só peço isso. Não preciso de mais potência. Preciso, sim, de sentir alguma ligação ao automóvel que conduzo, ainda que este seja eléctrico. Quero estar isolado das altas voltagens, obviamente, mas quero continuar a ter prazer ao conduzir o meu automóvel. E esse é o maior elogio que, enquanto entusiasta de automóveis, posso fazer ao Cupra Born. Até certo ponto, ele conseguiu-o.