Miguel Correia: De promessa a confirmação no Nacional de Ralis
O que é que Kalle Rovanperä e Miguel Correia têm em comum? O facto de serem, respectivamente, os mais recentes vencedores de uma prova do Mundial de Ralis, no primeiro caso, e de um rali do Campeonato de Portugal, no segundo. Depois, para além das inegáveis capacidades que ambos têm vindo a demonstrar aos volantes das respectivas montadas, pouco mais, infelizmente, devido às díspares realidades em que ambos desenvolvem as suas carreiras na modalidade!
O finlandês de 21 anos é piloto oficial da Toyota Gazoo Racing WRT, a equipa oficial da marca japonesa no Mundial de Ralis, tendo-se juntado no Rali da Estónia 2021 à lista dos agora “80 Pilotos Que Já Venceram Um Rali do WRC”, repetindo a dose depois na Acrópole (Grécia) e assegurando um terceiro sucesso já este ano, na Suécia. Quanto ao luso de 30 anos passou, num curto espaço de tempo, de promessa a uma assegurada confirmação como uma das actuais estrelas em ascensão dos ralis nacionais.
Integrado numa estrutura de contornos quase familiares, mas contando com os préstimos da ARC Sport, uma das mais capazes estruturas de motorsport a nível nacional, Miguel Correia acaba de conquistar o seu primeiro sucesso à geral numa prova do CPR, no recente – preparem-se que o nome é longo – Rali Terras d’Aboboreira – Amarante / Baião / Marco de Canaveses.
Um detalhe: nas portas do seu Skoda Fabia Rally2 Evo exibiu o nº 13… e há quem diga que dá azar! “É o meu número para o CPR desde 2020 e, fora algumas excepções, como é o caso das provas internacionais, em que tenho uma atribuição diferente, tem sido o meu companheiro em bastantes alegrias”, explicou à Garagem o piloto nascido em Braga, em 1991. “É, também, o meu dia de anos e o número da porta de casa dos meus pais, sendo com ele que faço várias outras felizes associações, razão pelo que continuo a tê-lo nas portas do meu Skoda”.
Um diamante em bruto, pronto a ser lapidado
A estreia na modalidade fez-se no Rali de Sernancelhe / Aguiar da Beira de 2017, na companhia do hiper-conceituado navegador Nuno Rodrigues da Silva (caso não saibam, foi quem, em 1995, ajudou Rui Madeira a conquistar a Taça do Mundo de Ralis de Grupo N), tendo o piloto de Braga levado o seu então Renault Clio R3 Maxi ao 3º lugar, da prova ‘Extra’. “Foi o culminar de várias tentativas junto do meu pai, de fazer um rali. Lá o convenci a deixar-me fazer essa prova, corrida na terra da minha equipa ARC Sport e integrado no grupo ‘Extra’, em que ele também estava inscrito. Tudo correu bem, bem demais até, pois acordei um certo ‘bichinho’ que me levou a querer mais, muito mais”.
Acrescente-se que caso se tivessem conjugados as três classificações desse rali – o rali principal, o pontuável para o então Regional Centro e o rali Extra (a sério, não entendo esta nova moda / necessidade de dividir ralis em subprovas e provinhas!!!) – poderia até ter figurado no top-10 em termos absoluto. Para estreia não estava nada mal!
Ao contrário de outros pilotos, que iniciam as suas carreiras noutras disciplinas de motorsport, seja karting ou em copas de iniciação, o Miguel Correia era o que se pode chamar verdinho verdinho, “tanto que sabia muito pouco do que era um rali, para além de que queria fazer um e aprender com isso. Como era tudo novo para mim, procurámos a ajuda de um dos melhores professores nessa área, recaindo a escolha no Nuno Rodrigues da Silva, nome cuja enorme experiência e palmarés falam por si. E pronto, a partir daí foi aprender e subir, até este que é, à data, o meu melhor resultado”.
Uma ainda curta carreira que passou, em 2018, por um Clio R3 Maxi, carro que o elevou a um primeiro título, o da Categoria ERT3 do Iberian Rally Trophy, bem como ao 3º lugar do CPR 2WD (duas rodas motrizes). Em 2019 subiu novo degrau na escada dos ralis e apostou num dos então R5, precursores dos actuais Rally2, primeiro com um Ford Fiesta R5, montada que viria a trocar por um Skoda Fabia R5 antes do final de um ano em que foi 7º do CPR. Em 2020, mantendo-se fiel ao modelo checo, subiu duas posições no ranking final do CPR, posição que repetiria em 2021, então já aos comandos da respectiva evolução, o Fabia Rally2 Evo.
Um início de 2022 bastante promissor
Preparando-se para o novo ano de 2022, Miguel Correia passou a ter Jorge ‘Jet’ Carvalho – outro conceituado nome da nossa praça, Campeão de Ralis (Navegadores) em 2017, com mais de 200 ralis iniciados – a cantar-lhe as notas a bordo de um Fabia revitaminado, verde, transbordando saúde! Começaram com um brilhante 2º lugar na secção “CPR” do Rally Serras de Fafe – Felgueiras, Cabreira e Boticas, a que se seguiu um 4º posto no Azores Rally em termos nacionais, prova que a dupla terminaria no 11º posto à geral. A cereja no topo do bolo – espera-se que seja a primeiras de muitas, de um doce que se quer tipo familiar – chegaria três semanas depois, com o 1º lugar absoluto na jornada da Aboboreira, depois de uma luta ao décimo de segundo com os seus principais adversários, Armindo Araújo / Luis Ramalho (2ºs no rali) e Bruno Magalhães / Carlos Magalhães (3º), todos eles detentores de múltiplos títulos nacionais.
O Skoda nº 13 terminaria o rali organizado pelo Clube Automóvel de Amarante com uns magros 2 segundos de avanço sobre o carro idêntico de Araújo e com 11,2 para Bruno Magalhães (Hyundai i20 N Rally2), sendo o mais rápido em 3 das 9 Especiais do percurso, sublinhando-se o melhor tempo registado na última de todas, num derradeiro e premiado esforço rumo a esse objectivo da vitória final. Amplamente festejado e efusivamente aplaudido, até mesmo pelos seus companheiros de luta, que não lhe pouparam nos elogios – até no tradicional banho de champanhe no final – esse resultado elevou-os, ao Miguel e ao ‘Jet’, ao 2º lugar provisório do CPR 2022, nos respectivos rankings. O resumo deste feito está em vídeo, nas redes sociais do piloto, Instagram e Facebook.
“Ainda estou em modo festa, a digerir o que aconteceu”, confidenciou Miguel Correia à Garagem, na passada noite do Domingo de Páscoa. “Vencer uma prova do CPR era algo que, de há uns meses para cá, foi ganhando contornos de realidade, objectivo por que lutei e trabalhei muito, por vezes a custo pessoal e profissional. Esse dia chegou finalmente, mas é ainda difícil assimilar e acreditar em tudo o que sucedeu”, referiu, agradecendo depois à família, aos patrocinadores e à sua equipa de sempre, a ARC Sport, “que me ajudou a concretizar este objectivo. São o que se pode chamar de uma verdadeira ‘Fábrica de Campeões’!”, alargando o agradecimento “naturalmente ao ‘Jet’, ele que me ajudou, me motivou e me deu a força necessária para transformar tudo isto em realidade!”
Miguel Correia junta-se, assim e em pleno direito, a uma lista hoje composta por dezenas de nomes e que começou a estruturar-se a partir de 1966, quando Manuel Gião venceu o então primeiro rali do também primeiro Campeonato Nacional (CNR), ou a outra ainda mais alargada, que remonta a 1956, ano em que Fernando Stock é referido como sendo o primeiro Campeão português de ralis de sempre.
“A partir do momento em que o relógio da partida passa a zero, a adrenalina domina-me. Esqueço tudo, foco-me na estrada e nas notas e só volto a mim no final da especial. São momentos únicos, uma experiência irrepetível”. Quem o refere é Miguel Correia, como nota de assinatura no seu portal, processo que voltaremos, decerto, a ver em próximas jornadas do CPR, quiçá, já no Vodafone Rally de Portugal, prova cujos primeiros dois Dias – outra brilhante invenção, o facto de nos ralis do WRC não haver Etapas mas sim Dias – forma a espinha dorsal da que será a quarta prova do CPR 2022. Aguardemos pela nova experiência!
Fotos: Oficiais / Miguel Correia (BigPress)