O Peugeot 208 é, muito provavelmente, o utilitário mais apelativo do mercado
Desculpem-me a repetição, pois sei que já não é a primeira vez que começo um texto desta forma, a falar do design. Sei igualmente que isto pouco vos importa, porque analisar um automóvel novo e começar pelo design não faz assim muito sentido. Gostar ou não gostar do desenho de um carro diz “zero” acerca da sua qualidade, sobre aquilo que faz bem, menos bem ou mal. No entanto, goste-se ou não, e no caso de um carro como o novo Peugeot 208, esta análise diz muito sobre o tempo “gasto” pela marca a definir as suas linhas finais, no papel, num ecrã ou num pedaço de argila ou outro qualquer material usado para se criarem versões à escala daquele que será o carro que eventualmente passará à produção.
Tive o privilégio de visitar as instalações da marca do leão em Vélizy, nos arredores de Paris, em 2018, para conhecer esta segunda geração do 208, ainda longe dos olhares do público. Assinado o acordo de confidencialidade e passadas as inúmeras portas e corredores apenas acessíveis a alguns dos mais altos responsáveis da Peugeot e do projecto P21, o código interno do novo 208, cheguei a uma impressionante sala/estúdio onde o 208 me foi mostrado e descrito com pormenor e entusiasmo. Nesse dia disseram-me, igualmente, há quanto tempo o projecto tinha tido início e eu simplesmente não podia acreditar. Não me vou pôr com grandes descrições, já fui longe demais e o resultado está à vista. O Peugeot 208 é um dos carros mais apelativos, impactantes e originais do seu segmento.
A Peugeot prescindiu da carroçaria de três portas. Uma decisão que embora custe aceitar, é compreensível. Mas com ela vêm coisas boas e coisas más. Começando pelas boas, e olhando para o 208, não tenho saudades de uma versão de três portas. Nada. Está no ponto. Mas sendo o design claramente a prioridade, o acesso ao banco traseiro, mesmo em formato de cinco portas, é bastante limitado. As portas de trás são pequenas e o acesso dificultado pelo desenho demasiado intrusivo da carroçaria, acima da curva do guarda-lamas. Já sentado atrás do banco do condutor, com os meus 1,8 metros, sinto-me apertado, principalmente nos pés, presos debaixo do banco. Será isto um defeito? Julgo que não. Permitam-me explicar, passando para os lugares da frente.
Sentar-me aqui, ao volante, é essencial para me aperceber da outra prioridade da marca: o condutor. Desta posição, esquecemo-nos rapidamente do espaço limitado e percebemos, também, que o 208 é como que um regresso às origens do conceito de utilitário. Um carro prático, fácil e divertido de conduzir. Terá um carro com sensivelmente 4 metros de comprimento de ser assim tão espaçoso? Sim, as cadeirinhas dos mais pequenos são volumosas, mas são assim tantas as vezes que levamos passageiros no banco de trás dos nossos segmento B? Creio que não. O 208 é um carro para ser conduzido e, de certa maneira, desfrutado, envolvendo o condutor na mais recente evolução do i-Cockpit da Peugeot e que pode, pontualmente, levar passageiros lá atrás. Gosto muito do desenho do tablier, da originalidade do painel digital 3D e do volante pequeno que a 50 km/h me faz sentir a bordo de um 208 Rallye (fica a dica, Monsieurs de Sochaux). Apesar disso, para ver a totalidade da informação no painel, sou obrigado a colocar o volante mais abaixo do que normalmente poria.
Debaixo do capot, outra boa surpresa. O 208 eléctrico vai ser o mais potente da gama, mas a seguir a ele, surge o 1.2 Turbo de 130 cavalos, aquele que à partida mais me apela, pelo que pensei que esta igualmente sobrealimentada versão de 100 cavalos me fosse saber a pouco. Nada disso. Nada disso, meus caros. Devidamente explorado pela caixa automática de 8 velocidades – com patilhas no volante – o pequeno três cilindros tem muito pulmão e convida-nos a “brincar”, a puxar por ele e a explorar melhor as capacidades dinâmicas do 208 que, diga-se, estão à altura do que de melhor se faz no segmento, mesmo que a traseira não seja tão reveladora quanto seria de esperar num pequeno Peugeot. Os tempos são outros e a segurança está, cada vez mais, no topo das prioridades, com uma electrónica sempre atenta e interventiva nos momentos de maiores exageros.
Quanto a conforto, nem as belíssimas jantes de 17 polegadas deste GT Line Vermelho Elixir, devidamente calçadas por pneus Michelin Pilot Sport 4, mancham o trabalho da suspensão, que nunca me pareceu exageradamente rígida, mas capaz de segurar devidamente a carroçaria do 208 nas situações mais exigentes. Tratando-se de um GT Line, equipamento de série é coisa que não lhe falta. Faróis full LED, pack Safety Plus e compatibilidade com Apple Car Play, Android Auto e Mirror Link são apenas alguns exemplos. Já o Elixir da carroçaria custa 610 euros (o belíssimo Amarelo Faro tem custo zero) e o tecto em preto mais 300. Se quiseres o ecrã tátil de 10 polegadas e as duas tomadas USB extra terás de gastar mais 640 euros. Tudo somado, e não esquecendo a presença da caixa automática, são sensivelmente 25 mil euros. Dói, não dói? Eu sei que sim. Mas estou a escrever este texto na esplanada do café e a olhar para ele, estacionado . “Amanhã”, depois de o devolver à Peugeot, ainda me vai doer mais.
Fotos: Automotiva